quinta-feira, 30 de dezembro de 2010

2011

O ANO NOVO

o branco incide
sobre a rosa
e a descolore:

o vermelho apaixonante
prejudica
o fogo exalado
pelo corpo

o branco insiste
esclarecer o desprazer
do processo

o sangue borbulhante
encarna o sentido ávido
com que os corpos se instalam

o branco ameaça
aclarar o mundo.

(Pedro Du Bois, inédito)

Caros amigos e companheiros
de jornada: que em 2011 possamos
concretizar nossos sonhos
literários e pessoais.

Abraços, e até lá.

quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

A RECRIAÇÃO DA MÁGICA

Dança: passos
compassos

corpos dançam
o instante do encontro

dançam mundos
imaginários

a dança conduz
os passos: corpos
acompanham

cessada a música
param os passos:
corpos permanecem.

(Pedro Du Bois, A RECRIAÇÃO DA MÁGICA, II, Edição do Autor)

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

PEDRAS

Debaixo da pedra
terra úmida

sobre a pedra
o calor do sol

na pedra
os minerais
em composição

pedras
são (apenas)
pedras
em sua finitude.

(Pedro Du Bois, JOGO DO NADA, Edição do Autor)

domingo, 12 de dezembro de 2010

Os Riscos do Objeto

Da coisa vista retiro o brilho e o peso
..................................opaca e leve
.................................................flutua

.................................................(não diz coisa
...................................................com coisa)

...........................recoloco o peso: cai
...........................reponho o brilho: arde

as feridas cicatrizam
a pele: as coisas
.............permanecem
.............em seus
.............riscos.

(Pedro Du Bois, OS OBJETOS E AS COISAS, III; Scortecci Editora)

sexta-feira, 10 de dezembro de 2010

A LUZ DESPOSSUÍDA

Sob o sol
frutificados
amores
vivem

há calor
e luz

desglorificada palavra
seca entre folhas
armazenada

sob o sol sente
no calor a luz
que o alucina.

(Pedro Du Bois, A LUZ DESPOSSUÍDA, Ed. do Autor)

segunda-feira, 6 de dezembro de 2010

(DO QUE SEI)

...
a ironia com que sobrevive o campo
em desprezados verdes e pássaros
pousados em galhos destruídos
como utensílio de cozinhas primitivas
onde fogos consomem paixões
apresentadas como novidades

repouso os olhos por instantes
e me sinto confortado em saber
que a imperfeição vigora sobre o fechado
hábito de me pensar diverso dos modelos

dias passam rápidos entre entusiasmos
de aprendizados e desconhecimentos
acobertados em belas palavras
de significados amorfos e confortáveis
temas não considerados ao lado órfão
e abaixo do instante em que a cena
termina em aplausos

flores condensadas entre secas folhas
de confissões ingênuas e largas escalas
não musicais de destroçada juventude:
revisito as palavras
e retiro o engodo
viscoso sobre a pele

calores e frios alternam temporadas
de caça e desafios em armas brandas
onde estou à espera da partida
animada em beijos e abraços

tempo em que a memória foge
ao descontrole e animais domesticados
ouriçam peles e se escondem sob as mesas
no estrondo longínquo e belo da tempestade
eletrificada na passagem: lembro os segundos
desconsiderados em relação aos recordes
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. II, fragmento; Edição do Autor)

domingo, 5 de dezembro de 2010

(DES)TEMPO

São flores
secas
permanentes
entre folhas
áridas
do caderno

passado revisto
em mitos
medos
esperanças
e certezas

flores secas
em desbotadas folhas
onde escritos
dizem de outros
tempos.

(Pedro Du Bois, (DES)TEMPO, Ed. do Autor)

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

ARMAZÉM DAS PALAVRAS

Homens-de-palha disseminam
pânico entre pássaros predadores
em quintais hortas pomares lavouras:

braços estendidos e cabeças eretas
miram horizontes restritos.

Por gerações pássaros não compreendem
a passividade dos espantalhos.

Homens estaqueados defendem o que não
lhes pertence: convencidos da imponência
em estáticas majestades.

Misturados tipos de nossos dias
vagam entre a majestática
coisa alguma de empregos vagos:
escancarado em medos infantis.

Carcaças empalhadas: aves que não arribam.
Coisificação do atraso: sem apoteose.

(Pedro Du Bois, ARMAZÉM DAS PALAVRAS, Ed. do Autor)

quarta-feira, 1 de dezembro de 2010

APRENDENDO A VOLTAR

Distingo a distância
como me fiz longe
nos anos de progressos
como me fiz perto
das linhas de regresso
como distingo
no traçado do caminho
a rota percorrida
em fugas

estendo o passo
ao horto
de onde se desprendem
cheiros ultrapassados

meço em distâncias
o tempo: tenho
o que mereço.

(Pedro Du Bois, APRENDENDO A VOLTAR, IV, Ed. do Autor)

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

CONVERSAR COM O MENINO

Posso dizer ao menino não cresça e permaneça estático
que as horas vindouras são más em destruições e mortes:
o menino responderia que a morte o alcançará como criatura
em brincadeiras e aprendizados: posso dizer ao menino ser
indesejável o modo como se tornará utilitário: o menino
responderia aceitar o risco se souber das finalidades:
posso dizer ao menino ser a finalidade o oposto da liberdade
e as respostas simétricas sobre a mesa absorvidas em fomes
aborrecidas e em sedes não saciadas: o menino responderia
serem as formas avessas do destino as brincadeiras
em cada manhã não assoberbada de afazeres: digo
ao menino não fugir da altura imposta ao salto
e permanecer sobre as pedras onde o concreto
substitui o sonho e ao sono não é permitido o acordar
risonho: asseveraria o menino sobre misérias e mistérios
e o desconhecido traçado dos anos passados em progressos:
ao menino conto sobre verdades aleatórias e mentiras
mensuradas em trajetos: o menino não saberia me dizer
da infância incorrigível em papéis de balas e da parafernália

do seu mundo obtuso reformulado em lógicas matemáticas:
o menino não aceitaria a minha palavra de fiança
e garantia e quereria a vida como prova da vivacidade
a demonstrar em gestos a vaidade do pássaro em vôo
além da irresponsabilidade da formiga em marcha: sobre
a morte diria o menino ardem segredos sem norte e hodiernos
transportes iludem as paisagens e o desdobrar do barco
na água repete a passagem: ao menino não caberia
a responsabilidade pelo crescimento em sobriedade
que à seriedade se transfiguram monstros
nas cavernas da memória: sobre afeições diria o menino
repousam ácidas questões irrespondíveis e das raridades
são ouvidos rasgos de coragem: a coragem grito eu ao menino
requer discursos e estratégias que ao medo sobram táticas
e explicações: sim balbuciaria o menino cansado do trajeto
na curta instância entre os medos impostos em cada reprimenda
na equiparação das partes e desde já pequeno e menino
se declararia em paz com as oferendas: das oferendas

vejo o menino traduzido em luzes inescapáveis
ao distanciamento: aos dias faltam espaços preenchidos
com bondades e aos adultos restam noites vazias
de utilidades: somos úteis e aos meninos
se oferecem liberdades completadas no fechamento
anterior ao espaço: todo percurso é o soçobrar
do barco: das águas finalizaria o menino surgem desconfortos
em cansaços e a insegura sensação da imobilidade: flutuar
ao menino adormecido pode ser o maior pecado.

(Pedro Du Bois, A NECESSÁRIA PARTIDA, Vol. II, Ed. do Autor)

sábado, 27 de novembro de 2010

A LEVEZA DO TRAÇO

Na poesia
desenho

sentimentos em palavras
amores em palavras
paixões

o traço exibe
as curvas
carrega cores

amizades em cores
mulheres em curvas

na poesia
rabisco

e o desenho se apresenta
nos olhos de quem o vê.

(Pedro Du Bois, A LEVEZA DO TRAÇO, Ed. do Autor)

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

O NASCER DOS ARES E DOS PÁSSAROS

Suficientemente tolos para acordar em cada dia
e de imediato lembrar o anterior e sofrer o próximo

os dias se sucedem em lástimas e glórias
e lástimas vergastam e glórias são efêmeras
como o voo do pássaro menor e o bater das asas
do rouxinol que pensa e canta seu grito
de apresentação e lembranças

antecipamos lembranças de dias futuros
estivéssemos na antecâmara do mistério
e ele nos fosse revelado previsível
nos detalhes
nas nuances
nos pensamentos
ruins e bons do que esperamos
que aconteça
sem mudar o sentido
sem que o sentimento acabe
antes da aurora que ilumina os corpos acordando
encostados como em grossas escoras no sustento
do alento que se esfumaça ao primeiro vento
pela janela aberta ao canto do pássaro
e às asas do colibri no frenesi estático
ante a flor cobiçada em alimento.

(Pedro Du Bois, O NASCER DOS ARES E DOS PÁSSAROS, 37, Vol. II, Ed. do Autor)

terça-feira, 23 de novembro de 2010

DIAS

Dias em que nuvens superam o horizonte
e voltamos para dentro, caramujos caseiros
desdenhamos luzes e nos recolhemos ao sal
que nos desmancha, enfeitiçados
no verde que da mata nos observa
em silencioso silvo da serpente
que nos acorda em lágrimas
silvestres de amostras
e telhados pontilham azuis
celestes do outro lado: gargalham
vozes inconsentidas no encontro
sutis de toques com que se fecham
as conchas: dias no infinito ardor
emparedado aos bilionários anos
de sagrações e esperas: antes
líquidos em demonstrações de afeto e graça

dias intercalados entre cercas recém fechadas
e o espaço vago das canções anteriores
nas vozes das sereias transformadas
em afeições profundas: frias águas cobrem
as esperas, raspam o fundo onde escrevem
algaravias descoloridas em passatempo;
residem tempos perdidos aos óbolos
não entregues, rugem tempestades,
feras incandescentes ao corpo na entrega
pegajosa das mentiras: ordens e desditas
as predições da cigana ecoam mares,
ressecam florestas

pelo caminho cartazes pedem o fim
das escaramuças: o caramujo indolente
ao tempo e ao sabor das coisas segue
riscando seu caminho fora da órbita
dos satélites, evoluem planetas vazios
de ocupações primárias, portas abertas
ao contato no atendimento aos seres
descobertos e mostrados; ao todo se permite
a entrega antes proibida: chegado tempo
das descobertas, portas fechadas não permitem
aos efêmeros e aos definitivos sairem
a vislumbrar a vista entrevista ao longe

longe refulgem raios de dias incontáveis
trajetórias de amanheceres e anoitecerem
corpos agasalhados em palavras ditas preces
em voz baixa que aos deuses cabe a atenção
perene das promessas e pedidos, cobram
desfeitas e dos bens apurados repartem
sonos em sonhos e vazios a que dão nome
de tempo desenfreado, desatinado
ao crime e ao castigo ofendido em atas

conseguem do mistério o entendimento
e fazem poses a perpetuar em fotografias,
estanques momentos desentranhados
em doença vislumbrada na febre
a turvar os olhos e a fazer o frio
do corpo onde aninhada a dor
se curva ao cansaço ciente
das histórias: o caramujo
avança sua casa entre pedras
e isolado concede ao espaço
a sua presença

sempre há quem se desentende e se desarvora
na passagem: o medo perdura enquanto noite
em nossas auroras, o menos aumenta sua urdidura
e acordamos em prantos por não sabermos a saída
e o engodo sobre nossa cabeça fornece o combustível
aos desenganos; nas mãos as respostas não vistas
nas translúcidas cerdas que ecoam o início
e nos trazem recordações vazias
dos olhares embaçados
entre o invernal dos outonos

tempos colocados sobre a mesa, disputadas rixas
e guerras vencem os espúrios cantos das sereias
serenadas em pedras sejam bruxas petrificadas
em fábulas desmoralizadas nos prazeres negados
à carne, o cerne ressurge encadeado ao gosto
no extremo gesto do perdão avolumado
à nossa porta: aberta, saímos ao vento
e perguntamos sobre a família, cores
e dores mínimas enquanto presos:
caramujos ressurgem em trajetórias
deslizantes sobre gosmas: caminhos
percorridos pela humanidade
não fossem secos passos e curtos
cumprimentos em que nos desconhecemos

dias despertados em músicas, a paisagem
retorna cores angustiadas dos dias, luzes
acesas em naturais ornamentos: paixões
buscadas em corações não abandonados:
certo e errado entrelaçados em faces
acobertadas na busca do etéreo e eterno
grito da saudade deixada sobre a mesa
para que ao sentarmos saibamos vê-la

dias em que os caramujos
lentamente avançam suas casas
e deles retiramos o engodo
e a gradativa forma da morada.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. V, Ed. do Autor)

domingo, 21 de novembro de 2010

DESTINOS

Tantos destinos
João Pessoa
Curitiba
Florianópolis

Sarandi florido na primavera
assoreado Passo Fundo
poluído Porto Alegre
dos casais

que Santa Maria
mais nau
que mãe
me leve ao Porto Seguro
ou ao Porto de Galinhas.

(Pedro Du Bois, CASA EM PEDRAS, Ed. do Autor)

sábado, 20 de novembro de 2010

CONSTRUIR

Um poema no Jornal de Santa Catarina.

http://www.clicrbs.com.br/jsc/sc/impressa/4,183,3115011,15935

sexta-feira, 19 de novembro de 2010

A CASA EM PROCURAS

Do escuro surge
não traz a luz
nem a revelação

na esquina espreita
não diz palavras de paz
nem de consolação

invade a casa
não traz amor
nem abre o coração

no escuro vive
dispensa as luzes
e evita clarões.

(Pedro Du Bois, A CASA EM PROCURAS, Ed. do Autor)

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

O DIA (A)FINAL

A fotografia tremida imagem
não percebida: luares dançantes
de apaixonados; cenas terminadas:
não se esqueça de sorrir, de especular
o olho à paixão. Não fotografe
cenas incomuns: a vida
repetida em barulhos. Treme
a imagem e a configura ao tempo
da finalização. O canto
sobrepuja o dia de discursos.

(Pedro Du Bois, O DIA (A)FINAL, 2, Edição do Autor)

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

NOITES DE VERÃO

Deito, apago a luz, reviro-me na cama.
Ligo a televisão, espero que algo aconteça.
Busco auxílio na imaginação, suspendo os pensamentos.

Levanto, busco um copo d'água, refresco-me.
Vou à varanda, olho as nuvens em passagem.
Volto para a cama. Recomeço.

Paisagens encantadas,
corpos de mulheres,
sorrisos escancarados,
barulhos no jardim.

Não era isso que eu pretendia
quando cheguei. Pensava
dormir. Adianta pensar?

Recolho-mo, insone, rompo
a madrugada. Bogart e Ingrid
repetem interpretações,
o chefe de polícia, olha.

No amanhecer, adormeço.
Pesadelos, enfim.

(Pedro Du Bois, AS PESSOAS NOMINADAS, Ed. do Autor)

sábado, 13 de novembro de 2010

VERDADES & MENTIRAS

...
por isso o canto
na voz da mulher
não amada
triste da passagem
rápida da fama
e do descaso

avança palavras
na essência
e volta ao anonimato
onde ciências pesquisam
novos gritos
cores
pássaros em substituição
aos extintos
ressurgidos
fênix encontrados
na próxima feira
de abjetos
...

(Pedro Du Bois, VERDADES & MENTIRAS, fragmento, Ed. do Autor)

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

O NASCER DOS ARES E DOS PÁSSAROS

A necessidade de se fazer ouvir:
ressentido das palavras ouvidas;
surdez consciente, onírico pássaro:
gritos, grita e recebe o retorno,
entorno da face em olhos claros,
resplandece o instante em que olha;
presente nos instantes das fotografias
disparadas na abrangência da cena
e do que há atrás do palco,
bastidores necessários ao ensaio,
cenários e o espetáculo

ouvidos servem à conveniência do momento,
atravessam a plateia e tem ao fundo o contracanto,
o palco freme novas sequências: o enredo
desdobra histórias de mesmos textos,
diversos, desconexos, inversos
em versos ritmados de bocas fechadas,
mímicas e mínimas frases descobertas ao acaso;
acesos olhos compreendem e se fecham

aos ouvidos os sons dos espaços vagos,
entorno das palavras, ecos da natureza,
pureza com que mulheres entregam suas lágrimas;
mentira com que nos cercamos em fantasias;
alvos atingidos, portentosa seta dirigida ao alvo,
concentração de tons: graves, agudos, atonais;
tonalidade em descoberta gravidade
com que verdades são proferidas: agudas

ouvir os sons do riacho, vagar entre pedras,
o limo e as plantas subaquáticas;
desenhos sobre a água, o redemoinho,
moinho movido e o barulho estático das pás;

onde o coração apaixonado na hora
em que o som se estabelece em segredos,
calma apaziguando ares: a hora é aquela,
não o interstício entre uma guerra e outra,
a clareza da água em sua profundeza,
som multiplicado em vasos intercomunicantes;
mesmo líquido repassado, som passado
ao ouvir a diferença entre os dias.

(Pedro Du Bois, O NASCER DOS ARES E DOS PÁSSAROS, 2, Vol. I, Ed. do Autor)

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

DOS AMORES

Sem nem me olhar
disseste "meu bem"

nem me olhando
reconheceste "meu bem"

rubor
embaraço
risos amarelos

voltaste teu olhar
desconhecendo "meu bem"

ficaste me olhando
fosse eu "meu bem".

(Pedro Du Bois, DOS AMORES, Ed. do Autor)

domingo, 7 de novembro de 2010


POSTIGOS, poemas de Carmen Presotto, com lançamento em 12.11, 20 horas, na Livraria do Argumento, R. Dias Ferreira, 417, Leblon, Rio de Janeiro.

sábado, 6 de novembro de 2010

SOBRE A TEMPORALIDADE

Passado ano
quando nos encontramos
e dissemos saber do futuro

ciganas espertas
leram nossa sorte e nos mantiveram
ansiosos em traços manuais

a descoberta de que o passado
presenteia o futuro

em anos ultrapassados
nos dissemos cientes do futuro

quando percebemos que iríamos nos separar:

encontros cancelados em trabalhos
e realizações: desencontros em sinais
trocados: contar os dias

fazer de conta que lembramos

em anos atrasados nos dissemos
futurísticos seres dos amanheceres

estátuas em sais: amargamos
sermos nossos destinos

quando da decisão inócua
imagens retornam em sonhos

quando não lembramos os sonhos
somos vazios em indiferenças

anos atravessam passados movediços
e nos depositam na solidão da casa

vislumbramos ser o futuro
gesto desmedido da saudade.

(Pedro Du Bois, a necessária Partida, Vol. I, Edição do Autor)

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

A ÁRVORE PELA RAIZ

Tem a seiva
alimento
a formiga presente
o cupim ausente
o sentimento da criança
posto em frutos
e amadurecimentos:
sobre o despencar da fruta
repete: ao pé
da árvore
permanece.

(Pedro Du Bois, a Árvore pela Raiz, 5, Edição do Autor)

terça-feira, 2 de novembro de 2010

FORA DE HORA

A palavra
amarga a boca
(mal)dita
na hora errada.

Travo.
Fel.

O olho
obscurece a vista
na negativa
do olhar.

(Pedro Du Bois, PASSAGEM PLURAL, Edição do Autor)

domingo, 31 de outubro de 2010

ASSIM

O dia destilado (desse lado?)
reflete no fundo
o gelo (em cubos)
com que sou recebido

dose (dosado)
em consumo de curtos
goles

de ácida vida.

(Pedro Du Bois, DESENREDOS, Ed. do Autor)

sexta-feira, 29 de outubro de 2010

DESCOBERTAS

Espera a água encher o pote
para ferver na vasilha o líquido inodoro
e misturar o chá necessário e forte

faz da infusão saudade e sorte
ao conhecer no sabor o vento e morte
e espargir o líquido em suor e norte

espia na vasilha o borbulhar da água
e espera o chá esfriar no pote
ao misturar a sorte necessária e forte

faz de conta que nada vale
o olhar perdido em horizontes ao norte
e sem mirar estrelas nem usar astrolábios
apenas entrever a terra avistada em frente.

(Pedro Du Bois, DAS DISTÂNCIAS PERMANENTES, Ed. do Autor)

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

A RECRIAÇÃO DA MÁGICA

A dança: passos
e compassos

corpos dançam
o instante dos encontros

dançam mundos imaginários

a dança conduz os passos
os corpos acompanham

cessada a música
parados os passos
os corpos permanecem.

(Pedro Du Bois, A RECRIAÇÃO DA MÁGICA, II, Ed. do Autor)

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

LIMA E CANHOTO

Arthur Moreira Lima
Theatro Santa Roza
Bairro do Varadouro
João Pessoa, Paraíba
Primeiro semestre de 1996
(ou teria sido em 1995?)

Pede desculpas, dedilha a teclas.
Mais da metade não respondem
ao seu toque. Ocas. Sem som.

Não havia como tocar naquela noite.
Promete voltar em setembro: desconfiança.
Risos irônicos.

No palco, em substituição,
Canhoto da Paraíba e seu violão.

Quem nunca ouviu Canhoto
morrerá sem entender ser a música
dulcíssimo céu e suas divindades.

Síntese e virtuose do som cadenciado
encadeado como feitiço feito.

Em setembro, lembrando Canhoto,
Arthur retorna: piano afinado.
Outro canhoto ou destro, tanto faz.
A noite faz-se música em nós.

(Pedro Du Bois, OS SENTIDOS SIGNIFICANTES, Ed. do Autor)

sábado, 23 de outubro de 2010

ESPAÇOS DESOCUPADOS

Busca o resultado
planando ao vento

sobre a terra
enterrado corpo
suspenso em sonhos

lembranças retificadas
na loucura momentânea
da verdade em desequilíbrio
avesso à insegurança

mudanças trazem
medos irrealizados
e a força sobreposta à perda.

(Pedro Du Bois, ESPAÇOS DESOCUPADOS, Ed. do Autor)

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

CONFUSÕES

...
sobe ao pódio e avista
na platéia o passado
indissolúvel em águas
ultrapassadas na imersão
com que suas lembranças
ressurgem altaneiras
e os anos passados
são alvos dos ataques

esquece as aventuras
contadas em rápidas palavras
de oferecimentos e descobrimentos

o futuro se apresenta
inócuo em luzes descoloridas
e frias de invernos
alcançados antes do tempo
preferido aos esquecimentos

no que se repetem as estações
se tornam pinturas enquadradas
em molduras onde cupins se alojam
e trabalham suas alimentações

autofágicas rememorações
consomem capítulos
alcançados em propagandas
e conversas olvidadas
ao público não cativo
dos facilitadores

aventura o restante em única ficha
e recolhe no tablado o nada
consta em seu favor
aos pares aos ímpares
insucessos sucedidos
em mal agradecido
aceno de quem sai

a solidão opaca
em sua mala resta a roupa
usada em situações
análogas de descrença
e vulnerabilidade

o final é o gesto parado
onde o braço levanta a mão
e o ônibus passa lotado.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. I, Edição do Autor, fragmento)

terça-feira, 19 de outubro de 2010

CECÍLIAS

As cecílias fecharam seus cadernos onde registravam, não em forma de diário, mas diariamente, seus poemas. Às cecílias é dado o direito e o poder de registrar poemas, trançando entre todos - se um dia pudessem ser reunidos - o que chamamos de poesia. Mas, na seqüência do que foi escrito, as cecílias haviam fechado seus cadernos, como gesto de abandono ou de desistência. Se as cecílias não mais escrevessem seus poemas e não os deixassem registrados em seus cadernos, a poesia sumiria das nossas vistas e nossas vidas não teriam mais a magia decorrente. Estaríamos presos em eternas correntes cecilianas e arrastaríamos nossas mágoas e nossas incertas horas de não adormecer ou de nos alimentar, que as letras são a primeira e a última refeição de cada dia. Não podem as cecílias por isso ou por aquilo, de repente e nas razões indiretas do que todas pensam em uníssono, ter tal desistência, adormecimento ou esquecimento. As raivas não se coadunam com as cecílias e delas tomam distância, para não serem transformadas em bonitas figuras decorativas, em amores conquistados entre manchas sobre as toalhas de mesa, ou naquelas pequenas marcas sobre as roupas. As cecílias têm - ou tinham - consciência do que representam - nos seus textos, muitos entremeados com figuras ou desenhos de flores ou animais de estimação, recortados e colados em seus cadernos -, para as demais pessoas que se chamam álvaros, américos, marthas, clarisses e possuem segundos nomes, como pedros antônios, pedros josés, tânias reginas ou marias antônias, anas marias e paulos cesários; as cecílias transitam sós em seus nomes e aceitam apenas únicos sobrenomes, escolhidos para que sejam confortáveis aos poemas e deles não se destaquem nem os atrapalhem quando forem lidos ou lembrados.
Os cadernos das cecílias estão fechados. Uns foram guardados em gavetas, sob coisas ou livros, outros ficaram sobre as mesas, escrivaninhas ou nas mesinhas de cabeceiras (desses, temos esperanças de reencontros ou revoltas) entre contas e breviários, despertadores e luzes menores. A maioria foi colocado em lugares secretos, fechados à nossa imaginação e conhecimento. Nesses repousa o mais grave: o nunca mais serem manuseados, nem sequer lembrados e terem seus poemas consumidos pelos tempos em que as cecílias, completando as cenas, também forem se esquecendo deles e elas, trocando de nome e esquecendo que eram cecílias, se transformem em pessoas como nós, com os nossos nomes e as nossas artimanhas, desconsiderando os poemas guardados no esquecimento com que as letras vão esmaecendo até que nos cadernos sobrem apenas alguns rabiscos em cada folha e não se possa recuperar o que foi escrito, nem ao menos saber que naquele caderno repousou uma vez uma cecília. A criança a quem for dado o caderno terá noites de insônia, o sono agitado de quem recebe a visita de cecílias; em cada amanhecer terá a tentação do grafite e, como ainda não sabe das palavras, preencherá folhas e folhas daqueles cadernos com figuras, traços e rabiscos e, mesmo que o que faça também possa ser poemas, não serão os poemas originais deixados pelas primeiras cecílias. Mesmo que essas crianças perdurem em suas vontades, não alcançarão a glória dos escritos cecilianos. Serão apenas traços e rabiscos, depois letras mal enjambradas, palavras mal escritas, versos tortos de desanimados seres que vieram depois do quando as cecílias pontuavam seus poemas no final das tardes e com cuidado guardavam seus cadernos para que as noites lhes fossem leves e seus sonos fossem calmos e não sonhassem além do que haviam escrito naquele dia e no outro e assim sucessivamente, até que o caderno fosse completado e, na verdade, para que ficassem completos, as cecílias escreviam nas contracapas, nas terceiras capas, antes e após as últimas linhas, nas capas e nas últimas capas. Nem um espaço poderia sobrar, mesmo que para isso tivessem que diminuir as letras, juntar palavras, mudar sentidos e, finalmente, antes de passar para o próximo caderno, lançar como despedida uma última frase poética sobre o tanto que lá estava escrito, ou sobre o rapaz conhecido naquele dia, ou sobre a tristeza de ele estar completo e nele não poder ser lançado mais um verso categórico ou oscilante sobre a vida, a obra, o dia e a noite cecilianamente encerrada em nuvens e estrelas alternadas.
O fechar dos cadernos das cecílias correu mundo; mesmo as pessoas mais broncas, mais ríspidas, mentirosas ou fascinantemente comprometidas com a escuridão e a maldade, sentiram os movimentos ritmados com que os cadernos foram fechados. O abandono da idéia que a todas permeava na certeza com que seus versos não eram entregues em cada tormento, a maneira singela e clara com que seus poemas nos consolavam. Estávamos órfãos, cada pedro, cada paulo, cada regina ou tânia, cada marina ou mariana, cada um que carregava dois, três ou mais nomes, porque as cecílias de simples nomes haviam decidido sem falar umas com as outras, sem ao menos serem conhecidas entre si, que os cadernos não eram mais necessários e que a poesia (antes de se transformar em outras letras que não aquelas) havia terminado. Os cadernos, mesmo os incompletos e até mesmo aqueles que as cecílias mais jovens estavam começando, foram fechados, assim como passa o vento diante das nossas janelas e só o sentimos se abrirmos os vidros e pusermos os braços para fora, e se encerraram sem barulhos, sons ou o mero farfalhar das folhas. São discretas as cecílias com suas obras, com os invólucros e com os gestos. São discretas como seus olhos captando os movimentos vindos de dentro e de fora de cada uma delas: são discretas quando escondem suas lágrimas.
Estamos aqui, desceciliados, na orfandade dos versos e dos poemas completados ontem, antes e por todo o sempre. Não haverá palavra que nos defenda ou que nos arremeta ao amanhã; os amanhãs serão iguais ao ontem e cada um de nós será sua própria palavra: fúnebre, alegre ou triste, desencontrada ou arranhada em paredes. Nossos grafites estarão quebrados, nossas lanças estarão partidas, nossos sonhos estarão acordados. Ainda nos sobrarão as lâminas das facas e com elas, em último e desesperado gesto, faremos nos troncos das árvores mais próximas entalhes de corações atravessados por setas e dentro deles escreveremos com a força resultante, sempre e em cada um, o mesmo nome, repetido e no plural, pois plurais são as cecílias que escreveram em nossas vidas os poemas mais belos.

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

ECOS

A voz recorda as horas
em que, pequeno,
tinha certeza de que o amor,
como nos filmes,
permanecia em beijos.

Abraçar a heroína,
geralmente loira,
esguia em seios fartos,
alimentou a minha adolescência.

O Cine Teatro Pampa,
em sessões vespertinas,
fez nossa alegria
com filmes europeus.

Duvido que o comendador,
proprietário do cinema,
tenha assistido qualquer
daqueles filmes.

Infelizmente, o cinema
foi transformado em estacionamento.
E o comendador morreu.

(Pedro Du Bois, REENCAMINHADO)

sábado, 16 de outubro de 2010

JOGOS

Corre, no deslocamento espera a bola;
no lançamento, a bomba sobre a cidade;
o centroavante busca o espaço
onde a bomba lançada explode,
contra a trave a bola se choca;
corpos retalhados atirados
de volta ao meio de campo;
não há repouso para os corpos;
carçaças expostas; a falha na jogada;
insepultos, empobrecem a paisagem,
frustram a atenção da torcida,
incendiando a raiva que perpassa;
cabisbaixa, começa a deixar o estádio;
povo subjugado pela força, a volta
se mostra inócua; o vencedor espera
ser para sempre, que a casa explodiu
com a bomba; efêmero lapso
em que a derrota cristaliza.

(Pedro Du Bois, O MOVIMENTO DAS PALAVRAS)

quinta-feira, 14 de outubro de 2010

A OBRA NUA

...

3
Diversificado, elevo paredes e cubro
a terra alicerçada em concretos atos.

O prédio simboliza a conquista do espaço
onde se materializam horas de regresso.
A prisão é o elemento apaziguador
da obra inconclusa: concluo a seriedade
da matéria não aproveitada. Entre janelas
sustento a nudez da espera.

4
Semibreve colcheia
entre pautas desafia
espaços em branco

(remeto o som ao intermediário
instante em que se criam
mitos
e se desnudam
histórias)

o som recorrente
das estátuas.

5
Pode ser a pedra
a tela
a madeira trabalhada
no dever do ofício.

O canto ressoa notas
elastecidas. O pássaro
alcançado
pela pedra
sobre a grama.

O animal selvagem decorre
horas em terras desiguais.

6
Sinto a hora em indistintas
cores e decomponho a paisagem
em cálculos: a operação
completada em números.

Inúmeros pares transitam
ímpares lugares.

O relevo do trabalho concede
atos de bondade no estupor
do corpo diante da cena
em desarmada
hora.

...

(Pedro Du Bois, A OBRA NUA, 1º Ato, fragmento)

terça-feira, 12 de outubro de 2010

NÚMEROS RECONTADOS

Sem consciência do dia e da noite
entende diferentes os dias e as noites
nos movimentos em relação ao sol

a terra em rotação e translação
a lua em translação

cálculos imperfeitos e imprecisos:
estações misturadas
em invernos
e verões

o calendário em velocidade
cria anos bissextos

sabe: o sol se move
galáxias móveis
móveis seres celestes

dias e noites questionados
na rotação da terra
e na translação do universo
..................................(conhecido)
onde o tempo terreno
é mero traço.

(Pedro Du Bois, NÚMEROS RECONTADOS)

domingo, 10 de outubro de 2010

MÃO

Pela mão
atravessa a rua
criança

a rua larga
a rua alarga
a mão se cansa

a criança solta a mão
cansada.

(Pedro Du Bois, POUCAS PALAVRAS)

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

A CASA DIVERSA

A heroína Anita
de tantas batalhas, ressurge
em novas linhas de significados
onde seu papel não são os tiros
e as adagas. São os filhos, as fugas,
as viagens intermináveis por mundos
estranhos e desconhecidos
de mesmas lutas fratricidas onde
perde a saúde, o amor e a lealdade
deixada à margem no caminho ingrato
dos que partem, esquecem, recomeçam
e das anitas estão fartos.

Os filhos longe uns dos outros: perto
as casas se repetem, o choro aumenta
e as anitas morrem em saudades.

(Pedro Du Bois, A CASA DIVERSA)

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

TÂNIA

Vens pela praia
descalça deusa
em pensamentos
absorta

posso ser teu guia
consolo
o riso fácil
no comentário alegre

teus pés n'água afastam
os passos rápidos
o olhar no horizonte
enfrenta as águas
por onde passas a areia
te faz leve traço

posso ser o barco ao longe
onde olhas o espaço
guardião da terra
em último compasso.

(Pedro Du Bois, LIVRO DA TÂNIA)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

O NOME PROVISÓRIO

Ao ser chamado pelo nome
esboço sorrisos e nego minha presença.

Renego minha ausência.
Assisto a hipocrisia
inundar a fala. Falo da antevisão
do corpo no erotismo
anômalo ao quarto.

O piano oferece teclas
ao dedilhar primário: oferto
preços ao preconceito.

(O professor nega a obviedade
no desinteresse pela classe: alimenta
esperanças nas luzes apagadas).

(Pedro Du Bois, A PALAVRA DO NOME, 4)

sábado, 2 de outubro de 2010

LIBERDADE

Na verdade
a liberdade
abre a porta

ouvimos
o bater das botas
e dos cascos

tempo fechado
em indiferentes livros
de repetidos cânticos
em adeuses

o estrondo da bomba
(a luz) quando explode:
nauseabundo corpo
morto em chamas

(liberdade em passagem
altaneira).

(Pedro Du Bois, LIBERDADE, 1)

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

PORTAS E VENTOS

Terra misturada
.....................orgânica
.....................organismo saturado
.....................em impurezas

ressecado pedaço
onde piso

terra pura
fértil e cheirosa
da minha infância
e do jardim da casa

terra perdida em passos rápidos
onde vendo a minha vida
em progressos de misturas hipócritas.

(Pedro Du Bois, PORTAS E VENTOS, Ciclo Um)

terça-feira, 28 de setembro de 2010

ALGUMAS PALAVRAS

Quem estranha o som
trazido pelo vento: madrugada
pródiga em silêncios

fugaz instante
de recordações
e tristezas
em recado ungido
ao som que atravessa
a rua, destranca
portas, descerra janelas

o grito revisa a hora
em que a morte
traz o cruel
recado: palavra.

(Pedro Du Bois, ALGUMAS PALAVRAS)

domingo, 26 de setembro de 2010

A MÃO QUE ESCREVE

Do traço retiro o ponto
precisa chave de entrada
ao caminhar constante

ponto a ponto
o novo traço
atravessa
o visto
e o vislumbrado
que fechado em nova saída
tranca a passagem
abrandada
em ventos
e sentimentos

destroços, pontuais encontros
não me dizem sobre o avançar

sobre o retorno escrevo
a confusão da volta:
revolto.

(Pedro Du Bois, A MÃO QUE ESCREVE, VIII)

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

SERES

Chamar ao tempo firmamento. Corpo afirmado
ao elemento inercial dos propósitos. A química
e o contato da sobrevivência. Ao corpo cabe
a providência da defesa em alertas diários.
Horários propícios ao desativamento. A mão
sustenta o corpo e a entrega se substancia.

(Pedro Du Bois, SERES, 5)

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

DOS AMORES

Amo pelos olhos tristes
adoro pelos olhos límpidos.
Sorrio contigo.

Sei no gesto a aproximação
sofro em cada negativa
afirmo o amor com palavras lindas.

Amo por tuas mãos macias
adoro por tuas mãos ásperas.
Caminho contigo.

Sei a hora do abraço
e sofro cada afastamento.
Afirmo o amor em jogos sem palavras.

(Pedro Du Bois, DOS AMORES, 5)

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

TEMPOS

Falamos de loucuras acontecidas antes do tempo
da seriedade abocanhada na graça dos corpos
inúteis em camas desarrumadas

amantes onde fomos enamorados
cada um olhou seu lado futuro
aberto ao nada dos exames médicos

inúteis seres não desabrochados: erros cometidos
em guindastes levantando honras aos méritos
preteridos, quisemos falar da hora
sem sentido, não o murchar
das flores no vaso, da água
que as apodrece ao contato, jovens

imitamos comportamentos adultos, adúlteras
formas de nos dizermos exatos cúmplices,
obra desfigurada ao expressar em palvras
o não sentimento, vontades eruptivas
de corpos quentes e nenhuma saudade

incompletos, evitamos olhares e vidraças
fechadas em câmaras que escureceram o quarto:
coberto, o espelho não nos refletiu, a opacidade
oportunista rendida aos medos
encontrados em gestos, toques e silêncios

voamos ares desconsiderados, como efígies
nos mostramos, um e outro lado,
faces intercaladas: tivemos pressa
e o rápido encaminhar do caso
nos trouxe acessos, raros instantes
de quase calmaria: poucas madrugadas

não devemos relembrar as loucuras,
cenas arrumadas, postiças, fora do tempo,
enredos mal anunciados, gritos lancinantes
tornados arremedos de conversas:
deslustramos histórias ao racionalizar
a época, circunstâncias, eventos e mentiras
desdobradas além da possibilidade
e encerramos nomes, locais e datas

refizemos em minutos anos desconexos
em tramas: não devíamos nos encontrar,
ficados distantes em vidas acontecidas
quando significados se reproduziram
em chamas consumidas ao todo: nada.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. XI)

sábado, 18 de setembro de 2010

RETRATOS

Meço a distância dos amigos.

Esmaecidos
amarelecidos.

Amigos resistem
fotograficamente
eternizados em juventudes.

Meço a memória dos amigos
nas brincadeiras de antes.

Na conversa fácil
com que atualizamos a vida
desde quando fomos distanciados.

(Pedro Du Bois, RETRATOS)

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

CAMINHO

Tenho o caminho e a companhia
a hora e o tempo
mas não estou pronto ao desfecho:
na dúvida persistente
no canto assombrado do pássaro
e na sorte anunciada em sina.

Contraceno minha morte:
pouco sei sobre o futuro
assalto ao coração em pulos:
o corpo teso nada espera dos fatos.

Invado o trajeto.
Desloco o corpo em arroubos:
roubo o beijo da mulher
mais próxima.

(Pedro Du Bois, O ESPAÇO DESOCUPADO)

terça-feira, 14 de setembro de 2010

PRIMEIRO DIA

No pátio vislumbra a árvore carregada
em frutos, não espera a hora da colheita;
a mão em leque sobre o galho; tem na mão
a fruta ainda verde, o vento entre a ramagem
indica a fonte e o pássaro negro em plumagem,
indiferente à árvores e ao fruto olha o homem
que tem na mão a fruta; não ensaia o voo, conhece
seus limites e teme pela sorte; a mão carrega o fruto
despreparado para ser comido; a água não apressa
o futuro; mesmo limpo está impuro, a vida é assim,
seca em ressentimentos, úmida de carinhos, aguada.

(Pedro Du Bois, A DIFERENÇA ENTRE OS DIAS, 3)

domingo, 12 de setembro de 2010

A PEDRA DESCORTINADA

Sou pedra
lançada
contra o vento

andante moinho
onde se perde
o tempo

de que vale
a mim
ser pedra arremessada
através do tempo
como consciência
e crítica

se ao vento
não cabem palavras?

(Pedro Du Bois, A PEDRA DESCORTINADA)

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

RAZÕES

a dança
os olhos
doces palavras
embriagam o vinho
e a cerveja
e o uísque
e a razão

momento e sentimento
em que a razão se apaga

embriagado corpo
na saudade
e na razão para ser presente.

(Pedro Du Bois, COMPORTADAS RAZÕES, VII)

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A AUSÊNCIA INCONSENTIDA

Tantas mortes
carregamos

morremos

somos
uma das tantas
mortes

carregadas
por quem deixamos

(Pedro Du Bois, A AUSÊNCIA INCONSENTIDA)

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

FICAR

...
primeiro caminho, carcomido em páginas rasgadas,
o animal sobre a calçada espera a vítima, rosna, grita,
impede a passagem; na volta, o retorno se faz quieto,
não adianta enfrentar a fera, para nada serve encarar os fatos;
não vai a lugar algum, na rua simples e destrancada o passado
perdura nas janelas abertas das casas conhecidas.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. X, fragmento)

sábado, 4 de setembro de 2010

CONCRETOS

Não idealizo:
sou fruto
ao pé
da árvore

como atos
de coragem

a vida se resume
em toques e vizinhanças
onde ideólogos buscam
na concretude do gesto
as explicações da sorte.

(Pedro Du Bois, A HORA SUSPENSA)

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

LEITURA

Não memorizo
palavas soltas
nem guardo comigo
o texto todo

gosto de saborear
as frases
aos poucos.

(Pedro Du Bois, PEQUENOS ESCRITOS)

terça-feira, 31 de agosto de 2010

PAIXÃO

Apaixono-me pela luz e a persigo
em beira mares, tenho com a areia
atritos indesejáveis: ter a luz
e os pés molhados; perco
a batalha, meu refúgio é o escuro
vão da escada: rabisco
a poeira em palavras versejadas
e anoto os dias.

(Pedro Du Bois, Casa das Rosas, QUINTA POÉTICA, 26.11.2009)

domingo, 29 de agosto de 2010

LIVROS

Agora sei colocar a cabeça
sobre o muro: último obstáculo
para enxergar o mundo.

Agora sei posicionar o corpo
ao encarar o adversário
e buscar seu ponto fraco
para o desarme.

Agora sei como tudo principia
na precária atualização dos fatos
compostos de palavras
multiplicadas em linhas
e parágrafos a desfiar textos
no que ainda chamamos livros.

Livros fariam mal aos negócios?

(Pedro Du Bois, O LIVRO FECHADO)

sexta-feira, 27 de agosto de 2010

TRANSFORMAÇÕES

Não há como o mínimo
se transformar em máximo:
............................seria mágica

e a mágica não disponibiliza
transformações baratas
............................e caras

a vida continua nas realizações
mínimas de todos os dias
maximizadas em cada sonho.

(Pedro Du Bois, TANTAS MÁSCARAS)

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

COTIDIANOS

Comprar as passagens, arrumar as malas,
pagar as contas: encontrar alguém
que possa cuidar das folhagens.

A partida próxima
é mais que aventura,
risco.

Arriscar o táxi até o aeroporto,
os hotéis, os restaurantes,
o reencontro com antigos amigos,
fazer novos conhecidos.

Fico em casa: viajo em minha cadeira
olhando as mesmas paisagens.

Aventuro sair em imaginação.
Com muito cuidado.

(Pedro Du Bois, COTIDIANOS)

segunda-feira, 23 de agosto de 2010

SAGA

...
as horas piores são as primeiras
onde os olhos alcançam o passado

depois cessam os sinos: encerram
os dias das mesmas formas
entre pássaros nervosos e a escuridão
que chega e acolhe

o estrondo nos acorda: assustados
alvos dos piratas na batalha descortinada
em luzes que nos alcança e derruba
e nos desfalece

minutos finais se prolongam
em passagens
ao contrário das boas horas
que não se repetem
em átimos de lembranças

da morte não há quem conte
os passos rápidos e as progressões ligeiras

quando saímos levamos impressões
da vida inacabada envolta em panos sujos:
únicos encontrados

a volta na repetição das lágrimas
em olhos cansados de desgraças
cercam as esperanças: animais
famintos em suas próprias presas

a acomodação aos fatos desalenta
espíritos jovens e desfalece
velhos desamparados.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Volume VI, Saga, fragmento)

sábado, 21 de agosto de 2010

A CONFIGURAÇÃO DO ACASO

Entre lugares
datas
horas
e circunstâncias

o encontro
se apresenta

o físico
e a mentalização
da palavra dita
em reconhecimento.

(Pedro Du Bois, A CONFIGURAÇÃO DO ACASO, Nível, I)

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

À ESPERA DE LUÍSA

O tempo se avizinha
no que a sua irmã
repete. Na limitação
do espaço
Luísa se permite
ao movimento
restrito de quem cresce.

Está no desenvolvimento
e recebe do exterior
o beijo sobre
a parede: sente

a espera e a calma
com que está sendo
aguardada.

(Pedro Du Bois, LUÍSA, I)

terça-feira, 17 de agosto de 2010

ENTRAR

Entreaberta porta
portinhola
caminho destrancado

olho o lado de dentro
sinto o conforto
troco a liberdade

com o pé fecho a porta
atrás de mim.

(Pedro Du Bois, A CASA DAS GAIOLAS)

domingo, 15 de agosto de 2010

BREVES GESTOS

A cultura decorre
das tantas vezes
em que aqui estivemos

chuvas
nuvens
sóis

entender o voo do pássaro
cego
compreender a germinação da planta
terra
abdicar dos sonhos infantis
cigarras

esquecer o passado
em toscas esculturas.

(Pedro Du Bois, BREVES GESTOS)

sexta-feira, 13 de agosto de 2010

RETORNO I

...
o irmão que me acolhe
sabe das bolhas em meus pés
e dos cabelos ralos

mal enxergo o futuro
em privações passadas
malgrado estar de volta
me revolto por ter voltado

meu gesto
de desespero
e raiva

sou sujeira retornada
do passado esquecido
reaquecido
em frágil pessoa
assomando a porta

esqueço o tormento
no único instante
em que enxergam meu corpo

outro é o corpo na entrada
de quem foi embora
em tempos piores

a serpente sibila segredos
e a pedra amassa a sua cabeça

não mentira minhas verdades
na pele retirada em oferenda

quero o regresso
o retorno ao tempo passado
o espaço e o tempo recuperados

no soluço reconheço a perda
(todas as perdas são detalhadas)
e como peregrino me liberto
em choro e provações diversas

nenhum paraíso permite o reencontro
entre os que partiram na bruma
e na chuva retornam

a lama dificulta o caminho
mascara os pés
indefinidamente

sou o estranho que retorna
ante os olhos atônitos
dos que ficaram.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. VIII)

quarta-feira, 11 de agosto de 2010

O LIXO REVOLVIDO

Recortes

fragmentação
em novas formas
do quebra-cabeças
com que contamos

vidas

o picote
o retalho
o norte
reencontrado em pedaços

o nada

posto no cesto de lixo.

(Pedro Du Bois, O LIXO REVOLVIDO)

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

O COLETOR DE RUÍNAS

Os etruscos foram os sucessores,
depois, romanos estenderam as datas
em vias rápidas e os desfiladeiros
derrotaram exércitos e elefantes:

o minotauro aprisionado
em labirintos: desvãos
preenchidos em estátuas

(ao chegar para avisar da vitória
o mensageiro descobre a morte:
uso indesejado do corpo
fisicamente exausto)

a escrita simplifica a mentira
em traços e impérios ressurgem
de forma rememorada: romance
predestinado aos desfiladeiros.

(Pedro Du Bois, O COLETOR DE RUÍNAS)

sábado, 7 de agosto de 2010

ADORMECIMENTOS

Na repressão em que escondem as coisas
boas da vida: imagem negativa e obstáculos
ao despropósito dos hiperbólicos
discursos de palavras esvaziadas
em entendimento: reprimendas
contadas no espaço negado
ao crescimento. O sadio encoberto
em pecados não praticados. Medos
de horas escuras de adormecimentos

a bola e a boneca: o estrado e o gramado
desbastados em ácidos dribles e comidas
feitas no faz de conta: escolhas antecipadas
das deformações estéreis. Horrores contados
em histórias infantis de adormecimentos

a sociabilização e o anacoreta disputam
bagagens em frágeis ombros
de empregados destituídos de conhecimento:
levam e trazem notícias. Fecham as portas
após a passagem não parcimoniosa
das horas resguardadas em adormecimentos

a paz fragilizada em desencontros: os fortes
batem nos fracos e a situação se inverte
quando a fortaleza se prevalece em moedas
e aos fracos cabe a subserviência ilusória
de que tudo se resolve em adormecimentos

mentir e esconder as palavras malditas aprendidas
no meio da rua e ter respaldo em antigas orações
de corações compungidos: cordeiros e lobos
restabelecidos em espúrios adormecimentos

nada dizer sobre ânsias e angústias que destroçam
pensamentos até que reforços se esgarcem e ceda
o piso onde se sustenta a calma e a paciência: irmãs
acorrentadas em tristes histórias de adormecimentos

ao sentir o perfume das paixões ter desacordado
o corpo para não sofrer a inação da apatia:
o tempo ao amainar das expectativas possa
voltar o todo ao que era em adormecimentos

ter a certeza sobre os féretros e os nascimentos: fins
e começos irrelevantes para a raça: desgraça familiar
ampliada na mesma mãe: sentir no passar dos anos
o ir embora e o vir chegando dos adormecimentos

calculada maneira de dizer que omissões precedem
a participação em ilusões e venturas acabadas
no troar das armas não lisonjeiras das intenções
onde se fundem vazios e mentes em adormecimentos

rasgar e colar pedaços presos aos cantos e desfolhar
o caderno na procura da página onde registrados sonhos
e fazer a bússula tardia aos viajantes: desistir da busca
deixando na estante o volume em adormecimentos

sufocar e resfolegar: afogado e enforcado corpo acetinado
de mãos macias que o retém em prisão dissolvida em sonhos
e vigílias de lembranças de esquecimentos enaltecendo
a vista encoberta em noites de adormecimentos

demônio responsabilizado: dores e alegrias, risos
e lágrimas, encontros e desencantos: o espelho reflete
a emoção como forma a fornecer os entalhes
onde se registram passos e aconteceres adormecidos.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. VII)

quinta-feira, 5 de agosto de 2010

MÚSICA

A oportunidade revela o gesto
da água ao escorrer o corpo: música.

Estar no lugar
da incerteza
e (me) perguntar
sobre a vida trespassada
em palavras.

Oportuno desencontro no espaço
temporizado: música.

Opor ao objeto a sua sombra
e retirar ao esboço o contorno.

(Pedro Du Bois, DESNECESSIDADES REENTRÂNCIAS & ALGUNS REINGRESSOS)

terça-feira, 3 de agosto de 2010

AMESTRADO

O cachorro
gira o corpo
busca contato
sabe a quem bajular

abana o rabo
no reconhecimento
de quem lhe sustenta
a vida em alimentos
e alisa o seu pelo

nós, amestrados
sorrimos satisfeitos
com o reconhecimento
do cão que nos faz
companhia.

(Pedro Du Bois, OS CÃES QUE LATEM)

domingo, 1 de agosto de 2010

O POETA E AS PALAVRAS

Sento e escrevo.

Penso no que escrevo
no que não consigo escrever.

Minha vida segue
indiferente
aos meus textos.

Releio o texto
procuro encontrar
o que sinto.

Minha vida para.

(Pedro Du Bois, O POETA E AS PALAVRAS)

sexta-feira, 30 de julho de 2010

DISTÂNCIAS

...
não meço distâncias em propriedades
corrigidas das ameaças
onde homens se enredam
como seres aperfeiçoados
de maldades e maldições

afeições encerradas em camada
de reservadas encenações
não reveladas das peças
apresentadas nos estertores
dos romances recomeçados
entre os intervalos

desce ao solo e recupera a imagem
desgastada dos que vieram antes
e a projeta ao depois de quando
os últimos tiverem a oportunidade
de irem embora

correta maneira de se medirem
as distâncias: construções desfeitas
na decomposição abissal dos defeitos
em respeito ao ápice das passagens
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. IV, fragmento)

quarta-feira, 28 de julho de 2010

TRAJETO INVERSO

Que faz o cão
junto ao portão?

Espera.

Levanta: último olhar
antes de retornar para dentro de casa.

Como fazemos
ao desistir da espera.

Fechamo-nos em nós mesmos
dispensamos os animais
e habitamos apartamentos:

andares altos.

(Pedro Du Bois, TRAJETO INVERSO)

segunda-feira, 26 de julho de 2010

DESPEDIDA

O olhar inicia a despedida
espaços preenchidos
com palavras trocadas
entre rios de vidas
.......................avança
na certeza de quem está
indo embora

adeuses rasos acenados:
voltar o rosto...............estender o braço
as mãos acenam e a visão se apaga
no embarque

o olhar se fecha na despedida
antes da passsagem a porta
tranca o sentimento bate
acelerado coração sabe
o passado e o futuro
.....................no estar
e não estar mais aqui e agora

até logo murmurado: quentes
verões em ventiladores
e o frio inverno interno
de infernais despedidas.

(Pedro Du Bois, VI Conc. Nac. de Poesias
do Clube dos Escritores Piracicaba, SP)

sábado, 24 de julho de 2010

BRIGAS

Não brigamos sobre nós
..................................mesmos

............................cada aspereza
............................e distração

.................nos remete ao outro
.................- melhor: à ausência
.................do outro
.................em nós
.......................mesmos

não me contém em seus gestos
obscenos, como não a tenho
..................................em ranços.

..................Dormimos a inadequação
..................da separação: temos sonhos
..................incomuns em reencontros.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 23 de julho de 2010

FLORES

Na parede repousam emolduradas
flores repintadas na irrealidade
das mãos: na possibilidade
dos olhos reconhecerem
na forma as cores
exaladas em perfumes.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 21 de julho de 2010

ENVELOPAR

O envelope contido: palavras
documentam o sensato: desdobram
tempos em cumprimentos. E se afastam.

Levados temas
ao inconclusivo: outro
envelope contem respostas.

A grafia insiste em revelar
ao tolo o insuficiente:
desprendido ao gesto
o olho enlouquece
sobre papéis riscados.

- O envelope rasgado em bordas
revela o conteúdo na insensibilidade
do que dizem vírgulas e parágrafos.

(Pedro Du Bois, Inédito)

segunda-feira, 19 de julho de 2010

MINHAS

Minha separação ultrapassa
o movimento do corpo

estende a suavidade
ao alcance da discórdia

o desdobrar da instância
na mesma coloração
deixada ao esmaecimento.

Minha ultrapassagem separa
desentendimentos: criança
refeita ao abandono em adulta
desforra de corpos esmiuçados.

A quem corroboro o iniludível
em frases
e falsos oásis.

(Pedro Du Bois, Inédito)

quinta-feira, 15 de julho de 2010

AMO EM TI

Amo em ti a energia
ao defender teu bem querer

a candura imensa
ao pedir perdão

amo em ti a força
que te faz mulher

a graça imensa
em permanecer criança

amo em ti o amor.

(Pedro Du Bois, SEMPRE MULHER)

terça-feira, 13 de julho de 2010

LEMBRANÇAS

Quando a saudade
passa a ser lembrança

mera lembrança

parece que tudo passa
com naturalidade

mentira

como doem as poucas
vezes em que lembramos.

(Pedro Du Bois, A ILUSÃO DOS FATOS)

domingo, 11 de julho de 2010

MAR ABERTO

Embebido em espumas
ameniza o caminhar
cambaleante

não está sobre o mar
e a terra firme
o embala

tênue imagem
esbranquiçada do horizonte:
sereias onde não há pedras

corpo embebido de saudade:
volta o rosto ao início
e sorri a certeza
do regresso.

(Pedro Du Bois, MAR ABERTO)

quinta-feira, 8 de julho de 2010

A PRIMEIRA CASA

A casa reside sobre a casa.
Construída na solidez hermética
das obras sobrepostas nas modificações
ancestrais da espécie: no começo
a simplicidade da defesa, o pensar
a ordem, o absurdo dos palácios:
a casa repete o emblema: não olha
o espaço aberto. A casa sustentada
na lembrança da casa dos pais.

(Pedro Du Bois, A CONCRETUDE DA CASA, 1)

terça-feira, 6 de julho de 2010

AMARES

nem os silvícolas
nem os indianos
nem os europeus

perdiam seus dias
sonhando mares

navegar impreciso
tempo passado em formas
estratificadas de guerras
e conquistas esgarçando impérios

a navegação alterou o futuro
de civilizações obrigadas a mudar
o rumo singrando mares em oceanos

passaram a sonhar águas
de viagens e mistérios
na efemeridade
da pouca fortuna.

(Pedro Du Bois, AMARES)

domingo, 4 de julho de 2010

EXPECTATIVAS

Se somos bons
somos cobiçados
se somos fortes
somos usados
se somos livres
somos aprisionados
se nos rebelamos
somos exterminados

a terra continua seu caminho
inexorável
ciclos se completam
inexoráveis

não adianta a vitória
a derrota chega sem ser anunciada

não interessa o que somos
fomos e ainda esperamos ser.

(Pedro Du Bois, A INCERTEZA DA VIDA)

sexta-feira, 2 de julho de 2010

AUSENTE

Trate de convencer a todos
de que você não esteve aqui
nem sua mão em aceno
disse adeus

o sono confunde as pessoas
mitos escapam ao controle
e sua mão acenou adeuses
inexistentes

faça com que percebam sua mão
junto ao corpo
tenso do exemplo
com que fez sua vida

o acordar das luzes da manhã
o orvalho sobre a grama
o vento frio

meras ilusões
você não esteve com eles
aqui.

(Pedro Du Bois, AS MÃOS EM CENA)

quarta-feira, 30 de junho de 2010

FLORES E HOMENS

Sou quem traz as flores:
buquê em mãos e as palavras
ditas na presença

pétalas pelo chão
na emoção do abraço

meras palavras
perfumam o caminho

flores murchas
marcam as páginas
das palavras ditas
no momento da entrega.

(Pedro Du Bois, FLORES & FRUTOS)

segunda-feira, 28 de junho de 2010

JÚLIA

Com olhos de avô
verei a ti
minha neta
e os olhos depositarão
em ti
a doçura da recompensa
que te fará feliz
em meses sucessivos

em maios e junhos: Júlia
serás vista
como serás
vista: fosse
a capa da revista.

(Pedro Du Bois, JÚLIA)

sábado, 26 de junho de 2010

MÁSCARAS

O suor escorre a máscara
desnuda o rosto
vazio em significados

na paisagem
o horizonte
escarpa o morro

além
também não há nada

a face antepõe na máscara
a desilusão frente ao pecado

como o nada
posto inerme
além da linha da paisagem.

(Pedro Du Bois, JOGO DO NADA)

quinta-feira, 24 de junho de 2010

A LUZ DESPOSSUÍDA

A vela ilumina a passagem
apago a paisagem
permaneço em ti
no escuro silêncio

troco outras músicas
o vento grita suas verdades
que terminam em chuvas

apago a vela
destruo a passagem
obstruo o sentimento

desconecto: fico contigo
e não há silêncio

o vento amaina o canto
recosto a cabeça
e acordo.

(Pedro Du Bois, A LUZ DESPOSSUÍDA)

terça-feira, 22 de junho de 2010

O Objeto Recomeçado

O menino transita ruas
e detido em luzes
vitrina: renomeia
manequins e roupas

espreita
atrás das luzes
fechadas ao público

honra a família
e se despede
em beijos
- sempre há um manequim
piscando
os olhos e girando o pescoço

(mesmo que o menino não olhe
para trás).

(Pedro Du Bois, OS OBJETOS E AS COISAS, 1ª Parte, II)

domingo, 20 de junho de 2010

DÍVIDAS

Sobre o dinheiro recebido em pagamento
nada diz
nada disso
é importante não fosse o troco
a ser recolhido como óbolo
para fazer crescer o todo
o bolo
o ódio ressentido das moedas
tilintando em bolsas
sacolas
carteiras
moedeiras
mãos vazias de atividades
reconhecidas em pagamentos e recebimentos
externados em recibos firmados
sobre estampilhas
e assinaturas
ilegíveis

sobre a obra feita
a compra efetuada
o trabalho composto
o sangue o suor e as lágrimas
derramadas durante a jornada
conta das derradeiras trapaças
com que os destinos suprem
os lugares vazios de significados

diz quem é e se destaca dos demais
e jamais pede socorro
ajuda
auxílio
esmola porque sabe
seu valor acima dos bens
imateriais das auroras
acontecidas ao sair de casa

sobre ir embora sem levar o dinheiro arrecadado
simula conceitos e algaravias onde recompostos
os sentidos originais dos pagamentos efetuados
e opta por saldar suas dívidas urgentes
em função do estado crítico dos credores
dos agiotas
dos financistas
dos plantonistas de bocas
infernais onde queimam as melhores
intenções e o demônio sobrevive em águas
nem tão tépidas que não possa usufruir
suas maldades adicionadas aos erros
praticados pelos pagamentos
pedintes
viúvos alegres em noitadas
vivenciadas em estrondos
solertes das moedas mal empregadas

quem de nós pratica o primeiro crime
tenha o corpo retirado da sala pública
o espírito espoliado das questões críticas
a passagem apagada dos livros únicos
sua vantagem anulada em éditos súbitos

dos ouvidos moucos com que se fazem ausentes
criminosos anteriores lançam novas verdades
descascadas em frutas ácidas de largas sementes

somente o andar da carruagem faz enjoar
o cavalheiro em bancos perfumados
defumados
afundados
do restante do ócio faz o encontro amado
e tem da companheira o olhar cerrado
dos enganos desvendados: o pagamento
feito à pessoa errada não livra o devedor
de passar outra vez pelas mãos do credor
como regra e regulamentos e livros de leis

evita pedras jogadas
contra o corpo
defende-se com os braços
e as mãos entendem
a dor da dívida
como resgate.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. IX)

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Saramago

Estar em Saramago
como quem vai para destino mais rico.
Pesado, mas não gongórico.

Folhas e folhas além da simples leitura.
O castivar do prazer em palavras
trechos e parágrafos.

Parágrafos longos sem favores.
Mais do que ler: gostar da sua companhia.
Traduzir-se em suas ideias.

Ser mago sem ser amargo: Saramago.

(Pedro Du Bois, AS PESSOAS NOMINADAS)

terça-feira, 15 de junho de 2010

PONTES

Vivo entre pontes
salto rios e lagoas.

Entre elas corre
minha vida tortuosa:
sobre pontes majestosas
meus sonhos
se apresentam.

Não fossem as pontes
eu teria naufragado
em alguma curva do rio
na profundeza das lagoas.

Pontes tornam menores
minhas distâncias: evitam
aumentar o meu cansaço.

(Pedro Du Bois, DAS DISTÂNCIAS PERMANENTES)

domingo, 13 de junho de 2010

DANÇAS

Avança o corpo
ao encontro

a música dirige os passos
entrelaçadas mãos
sôfregas

o corpo sente o avançar
do corpo
freme
treme
se encosta

o sofá recebe a música
onde a vida começa.

(Pedro Du Bois, A RECRIAÇÃO DA MÁGICA)

sexta-feira, 11 de junho de 2010

APRENDENDO A VOLTAR

Aprendo a voltar
e me perco
em recordações:

passados
petrificados
em passos
de retornos
fechados
em acasos

aprendo ser a volta
o pior do encontro

rasgo instantâneo
do corpo
ao mistério.

(Pedro Du Bois, APRENDENDO A VOLTAR, I)

quarta-feira, 9 de junho de 2010

(DO QUE SEI)

O veneno destilado sobre as flores
influencia tempos habitados
em pensamentos incolores
do passado: venenosas
peças necessárias ao armazenamento
dos ditames e proclamas
distribuídos em públicas praças
ameaçam e entrelaçam
inverdades perdidas
no rumor desperdiçado
em poentes ensolarados
dos dias findos
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. II, fragmento)

segunda-feira, 7 de junho de 2010

O VOO DO PÁSSARO

O voo do pássaro precioso esboço sem o papel
a tela se desfaz em espaços abertos
pautas e linhas sobrepostas na cursiva escrita

traçado o trajeto modifica o tempo da passagem
prende o corpo ao objetivo e o vento nas asas
cintilantes formas soltas entre linhas e pautas

quem dera o primeiro passo seja o início
sem o tormento da dúvida consumida na queda
da desistência feito o efeito espacial do antes

ser livre em singelos voos de envelopes
sob a porta em mãos despertas em sinos
e campânulas de águas quentes da espera

espaçosas asas circunscritas ao calor de vésper
anunciam a noite na aproximação do escuro
fria maneira de se colocar em dia com as luzes.

(Pedro Du Bois, O NASCER DOS ARES E DOS PÁSSAROS, Vol. II, 35)

sábado, 5 de junho de 2010

A CASA EM PROCURAS

Casas enfileiradas
homens enfileirados
batalhas campais

ruas paralelas
pessoas paralelas
armas na mão

razão maior
do fim de tudo

o que foi
e não retorna

o que não é
maior ou menor

fileiras
alas
paralelas
finais.

(Pedro Du Bois, A CASA EM PROCURAS)

quinta-feira, 3 de junho de 2010

ARMAZÉM DAS PALAVRAS

Onde repousa a justiça
se não na liberdade?
Onde maior autoridade
do que o exercício da razão?
Onde a responsabilidade
se não houver virtude?

Só assim
podemos dizer
poder
repleto de glória.

(Pedro Du Bois, ARMAZÉM DAS PALAVRAS)

terça-feira, 1 de junho de 2010

RELAÇÕES

Busca na relação o sentido da permanência
no primeiro beijo e no olhar com que a sequência
se faz maior que a realidade fantasiosa do encontro

a relação inicial concretizada em palavras
de apresentação e desvelo com que lhe abre
a porta e lhe puxa a cadeira e lhe serve o copo
e da relação entre o por do sol e o sal no prato
adocicando a passagem e a paisagem posta
ao lado cúmplice e sócia das mãos e dos braços

relação em anseios e os seios em suas mãos
cálices e glorificados troféus conquistados

o rubor das faces e o rubro vinho derramado
sobre a toalha: olhos nos olhos não contemplam
o ocorrido em vãs tentativas e o sangue seca
entre dedos entrelaçados na relação

o relacionamento espera e a esfera roda
como moedas esperando a hora
dos pagamentos pelo corpo
em flores e cartões de palavras bonitas

na reflexão do começo as mãos tremem
o ato em pétalas frágeis e singelas secando
atenções despretensiosas dos pecados avistados

repete o gesto de arrumar os cabelos sobre os olhos
e em retorno o leve toque dos corpos desfaz
pensamentos interiores e sua dedicação incita
a progressão das mãos e o hálito perfumado beija
e avança sua boca em fornalha e o fogo consome
o instante em pensamentos ignorados

a relação principia e permanece em orações diárias
no rosto que lhe concede o descanso em que dorme
balbucia seu nome e tem a resposta: sabe o nome
e tem a sensação de que tudo termina naquele ato

grita sua relação públicamente divulgada aos ventos
em defesa e seu escudo rompido no aceno displicente
com que o vulto se afasta olhando para o outro lado

rememora o tempo o sentimento o encontro
e o toque suave onde encontra o mundo desfeito em sombras
do relacionamento desamparado no que não tem finalidade.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. V)

domingo, 30 de maio de 2010

O NOME

De todas as formas
o nome
é o significado
do entendimento

vezes mágico na atemporalidade
da surpresa acontecida

no tempo certo: o que se registra
como nome ou suspiro

no que me diz respeito
como âncora e ânfora
destampada exalando
o perfume reconhecível
do que não compreendo

nomes são segredos
antecipados aos poucos
refeitos dos seus apropriados
apelidos e alcunhas.

(Pedro Du Bois, AS PESSOAS NOMINADAS)

sexta-feira, 28 de maio de 2010

16.10.1947

(com a ajuda de Miguel Bakum)

O corpo avisa a hora
há demora
e o nascimento ocorre
no final do dia
a noite abraça a criança

noutra cidade
na mesma data
um homem gesta suas horas
em desenhos

a árvores surge em seus traços
representativos e fortes
como a criança nasce em abraços
e esperam que ela tenha
sua vida
representativa e forte

o desenho resguardado sob o vidro
assegura ao menino
a vida desenhada.

(Pedro Du Bois, (DES)TEMPO)

segunda-feira, 24 de maio de 2010

ENCOBERTO

...

XVI
Suave o aroma se desprende
o rosto mostra traços
a animação chega
como pássaros
ou frutas amadurecidas
é passado o tempo
de desânimo
em outras vidas
como lhe será entregue o selo
a ser rasgado e nele a sombra
se fará dia
como dia foi
a data da chegada

XVII
Pode não ter vindo inteiro
a arca trouxe o que foi encontrado
a marca das partes
na história repetida
em versos
localizados
do poeta
que dizem da chegada
até a morte consumida
em vida
e o apagar
das luzes
...
(Pedro Du Bois, VERDADES E MENTIRAS, fragmento)

sábado, 22 de maio de 2010

O NASCER DOS ARES E DOS PÁSSAROS

Simples desejos em altos patamares
de quereres; da imensidão a luz e o brilho,
jóias em coroas recurvadas ao séquito
dos servos não perfumados; simples desejos
de buscas incontestes da verdade
recoberta em panos toscos de mentiras,
o que reveste a memória e o sofrimento;
apenas desejos intercalados em cenas
de fins de mundos, o regozijo
ao reinício como pássaro ou espada;
apenas desejos entre ouvidos sons
de gorjeios e gritos, silêncios traduzem
épocas do que foi permitido, saliente
prova do acontecido; simples os desejos
e os simples desejos em ventos
levados ao longe: ao não contente.

(Pedro Du Bois, O NASCER DOS ARES E DOS PÁSSAROS, Vol. I, 4)

quinta-feira, 20 de maio de 2010

A LEVEZA DO TRAÇO

A estátua:
tridimensional
momento
lapidado

hábeis mãos
encaminham o corte

pote colocado no fogo
o forno recebe o molde

a estátua permanece
na repetição do gesto:
movimento estático
em que é colocada

fria testemunha
de mais nada.

(Pedro Du Bois, A LEVEZA DO TRAÇO)

terça-feira, 18 de maio de 2010

BAILARINA

I
Bailarina de pernas alongadas

e finas: fecha os olhos ao girar o corpo
de elastecidos músculos: sorri em gestos
ao receber o parceiro

esguio corpo de bailarina: criatura de luzes
em rápida corrida e parada na revoada em volta
revoltas águas completam a cena

na ponta dos pés avança passos
há graça nos braços levantados
metálico rosto retesado
ao contar os passos
lembrando o andamento
da música até a cortina cair

a bailarina em frente aos olhos cai
tem graça o seu cair: caio com ela
rompido elástico: rompido contato
quebrado dom.

II

... bailarina
estática
na cena
móvel

no estupor da plateia
o aplauso
se espalha
ao inusitado.

III
Quando nos fazemos esperança
em palco nu de panos
brancos
vemos a mulher caminhar
entre nadas
fosse o todo
o tudo
onde a alma trafega
trânsfuga de si mesma

esperança em motivo e sonho
branca
nuvem transformada na passagem
daquela mulher dançando
seu corpo
móvel

sabemos o sentido dos passos
e dos aplausos fortes e continuados.

(Pedro Du Bois, A RECRIAÇÃO DA MÁGICA)

sábado, 15 de maio de 2010

PINTURAS

Sobre a novidade sobrepõe velharias

velhaco de sempre sorri esquinas
de desencantamentos

o novo refulge a ideia de mudança

nada disso se opõe ao risco
do som interposto em acordeões.

A pintura guarda palavras desditas
em artimanhas.


(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 13 de maio de 2010

APALAVRADOS

Palavras brincam
papéis afora: folgam
significados e enredam
frases. Arremessadas
ao vento
retornam risos
ecoando montanhas
de sentidos: praguejam
futuros desafortunados
em rimas descompassadas.

Desprezam adjetivos
e evocam tempos subjuntivos
de vamos ver.

As mãos em movimentos sistemáticos
apagam letras: sobre a superfície
esvaziada desenham números
....................................decimais.


(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 11 de maio de 2010

SOBRE A DOR

Invenção

A observação do profeta sobre o nada.
Não ter o que dizer sobre o início
e estar tolhido - pela promessa -
em revelar o dia de hoje.

Entrever no estranho cruzamento
o rosto conhecido: desdizer
bom dia e voltar a face
à regressão do esteta.

Estar presente ao descoberto
espírito e me fazer carne
em dores de parto.


(Pedro Du Bois, SOBRE A DOR, 69, inédito)

domingo, 9 de maio de 2010

A PREVISÃO DO IMPROVISO

A noite em desencontros
ressoa horas de cantoria:

o silêncio perdura
no corpo
inerte
ao acontecido.

A sugestão da vidente
transposta ao passado
incomprovado: prevejo
consequências e estreio
caminhos demonstrados.

Improviso suspenso
em bandeiras desfraldadas.


(Pedro Du Bois, A PREVISÃO DO IMPROVISO 42, inédito)

sexta-feira, 7 de maio de 2010

ABSURDO

Absurdo tentar
tantas vezes
quantas
são
as oportunidades

alardeadas
em versos
propositais
em frases
desproporcionais
em silêncios.

O silêncio expande
o gesto: da janela
habito outra janela
de onde espio
a janela
contígua.

Contigo sei da ambição
covarde dos arremates
da vida encurralada
em ares de grandeza.

Tentativas revidam
o inoportuno sono
de estar cansado
ao relento.

O relento ambicionado
na tarde ensolarada
se desfaz em adjetivos
orgulhosos da cadeia
alimentar do pássaro
arrojado ao solo.

Descolo minha vingança
em beijos e abraços:
não sabem ao certo
da minha incerteza
e se dizem amigos.

Basto a mim mesmo:
organizo papéis
e sirvo alimentos
sobre a mesa
despojada de garfos
e facas. Traço as mãos
ao encontro do peito
penetrado em ordens
arrazoadas.

Como ingrediente súbito
da ambição absurda
da saudade.

Orei tristezas quando criança

retirei da carcaça
deixada às feras

a intervenção revolve
verbos: monstros odeiam ácidas
palavras. Sinônimos
e antônimos distraídos.

Ouço o absurdo da proposta
e me revelo no sentido
longitudinal do avesso.

Talvez a dúvida recomposta
em vértebras quebradas
na imobilidade do ataque.

Gosto de ouvir
a mulher amada: gritos
ironizam o espaço
despercebido em cela.

Gosto de me recostar
ao muro e receber
a frieza da pedra recoberta
em hera. Em eras anteriores
não me fiz apresentável
e fui despojado.

Ambiciono o dizer escasso
das entrelinhas. O estremecer
da floresta vislumbrada
na folha suave contra o solo.

Calo. O colo da mãe perde
a consequência e da criança
havida restam ralos cabelos.

Nada sobre a testa direciona
o canto. Nada sobre o conto
redireciona os olhos.

Durmo a absurda
razão de estar presente
ao desencontro.

O que me basta
por enquanto.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 4 de maio de 2010

SOBRE POESIA

Pode ser acromática
visão: enlevo
do eterno
(fugaz)

a intelectualidade
reprova a gentileza

paixão é arte
disposta em expressões
(naturalmente)

a luz reflete
a passagem do planeta
imerso em consentimentos

(fugazes)

pode ser cronometrado
o tempo disposto
ao sentir: a morte
revela o convite
não traduzido
(naturalmente).


(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 27 de abril de 2010

A ÁRVORE PELA RAIZ

Forte
ao solo
imersa
hidropônica
ao vento
relata o sentido
do verde
fotossíntese:
calor queimado
na rede armada
à outra ponta.


(Pedro Du Bois, A ÁRVORE PELA RAÍZ, 1)

domingo, 25 de abril de 2010

APENAS

Apenas uma vez
falei dormindo
menti

apenas uma vez
caminhei dormindo
caí

apenas uma vez
sonhei planos futuros
acordei.


(Pedro Du Bois, PASSAGEM PLURAL)

sexta-feira, 23 de abril de 2010

AMADA

Suaves acordes
como a nossa convivência:
escrevo, interrompe-me.
Beijo-te com paixão.

A música ao fundo
complementa
o ato de amar.

Cansados na viagem
árdua: nosso caminho
é destino comum.

Boca a boca
olhos nos olhos
mãos entrelaçadas.

Suave balada
e passos lentos.

Dançar
com a mulher
amada: conviver.


(Pedro Du Bois, OS SENTIDOS SIGNIFICANTES)

terça-feira, 20 de abril de 2010

ÚLTIMO

O homem na defesa
da última linha
antes do fracasso
assume a responsabilidade
e oferece sua vida
diária
para evitar o progresso
a entrada
o assalto
a conclusão do ataque
com que se lançam
sobre a cidadela
e despejam
suas forças
suas raivas
suas frustrações diárias.

(Pedro Du Bois, ESPAÇOS DESOCUPADOS)

domingo, 18 de abril de 2010

LIBERDADE

Olha: por momentos
sente a liberdade
passageira

espia o mundo: vê
imagens em sonhos

entende o sentido
da liberdade

sabe quanto custa realizar
a vida sonhada
em cada instante.

(Pedro Du Bois, LIBERDADE (Elas), 1)

sexta-feira, 16 de abril de 2010

O QUE DEVE SER FEITO

...
visões irrepreensíveis
de cabeças abertas
aos sensores decorridos
das espionagens
e dos prêmios ofertados

o andamento do objeto
identificado aos que ficam
sobre terras enxutas
e nada é popupado
aos sofrimentos mantidos
na coragem das perguntas

o fazer não pode idiotizar
as relações irresponsáveis
dos lazeres descritos
em prazeres baratos

rasgada a roupa assoma
o corpo mentiroso das torturas
arrancando a pele por onde
passam unhas avassaladoras
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. I, fragmento)

quarta-feira, 14 de abril de 2010

PARTIDAS

Não senti saudades
quando mudamos
de casa na mesma cidade
era muito criança

não me importei
quando fui embora à trabalho
para outra cidade
era muito jovem

não pensei em ficar
quando fui transferido
pela primeira vez
(minha mulher foi junto)
era o progresso

não tive porque ficar
após a carreira
quando voltei com minha família
era o regresso

não me preocuparei
quando tiver que partir
concluindo o ciclo
cedo ou tarde

serei a lembrança.

(Pedro Du Bois, REENCAMINHADO)

segunda-feira, 12 de abril de 2010

CICLO UM

No final do dia
retorna

(quando a chuva permite
o passo rápido)

a casa espera
a sua chegada

humilde quem chega
humilde quem espera

o dia finda no retorno
da configuração do ciclo
na certeza da repetição
do próximo dia.

(Pedro Du Bois, PORTAS E VENTOS)

sexta-feira, 9 de abril de 2010

JOGOS

Todos os jogos
vitórias
vencedores
ganhadores

todos os jogos deixam no ar
a superioridade
comprovada

conhecimento
força
habilidade
sorte

todos os jogos
derrotas
vencidos
perdedores

quem faz da vida
a busca do sucesso.

(Pedro Du Bois, O MOVIMENTO DAS PALAVRAS)

quarta-feira, 7 de abril de 2010

1º ATO

Amenizo o calor instalado em ondas
indesejáveis ao frêmito dos corpos
abandonados. Espero acompanhar
o espírito entre mentes caprichosas.

Desnudar a água
e o fogo: elementos
trazidos ao acompanhamento.

(Pedro Du Bois, A OBRA NUA, 1º Ato, 1)

segunda-feira, 5 de abril de 2010

NADA

Primeiro beijo

revelação
infinita possibilidade

ou nada.

(Pedro Du Bois, POUCAS PALAVRAS)

sábado, 3 de abril de 2010

NÚMEROS RECONTADOS

Vinte anos recém transcorridos
dúvidas sobre sair de casa
apoio integral dos pais

vinte anos longamente percorridos
nenhuma dúvida sobre a vida
nem sabe quem são seus pais

vinte anos loucamente exercidos
sem dúvidas na maior parte
não compartilhadas com seus pais

vinte anos finais acontecidos
na dúvida de a sensação existente
suprir a vida agitada dos seus pais.

(Pedro Du Bois, NÚMEROS RECONTADOS)

quinta-feira, 1 de abril de 2010

TÂNIA

Tens a intensidade do linho
áspero e cru
seda entre os dedos
voz com que falas tua vida
olhos sobre todos nós

espírito inquieto
de quietude e paz

tens a intensidade do amor
colocado acima
do que o corpo pede
em paixão

és intensa como pensas a vida
a morte não te faz medo
cristã de arrependidos pecadores

tua vida é intensa e não há pecado
em tuas mãos.

(Pedro Du Bois, LIVRO DA TÂNIA)

terça-feira, 30 de março de 2010

DOS AMORES

porque te amo todos os dias
estou acordado
pensando nosso futuro

pensar o futuro
como apanhar estrelas
em firmamentos

o amor prescinde
certos tormentos:
a inveja
e a intriga
não participam

idealizar o futuro
sem abdicar do passado
na história repetida

o amor que nos seduz
nos conduz: e nos levará
em revoada na tempesteda
que se anuncia.

(Pedro Du Bois, DOS AMORES, 3)

domingo, 28 de março de 2010

A CASA DIVERSA

Do alto
avista

cidade presa
concretadas casas
enredadas ruas
nuas

há prisão maior?

(Pedro Du Bois, A CASA DIVERSA, dedicatória)

sexta-feira, 26 de março de 2010

O NOME PROVISÓRIO

Interessado em naus
naves
navegadores (mares permanentes
deixados ao espaço preenchido).

Nado ao encontro e a tormenta
foge vagas. O nome: vago.

(Pedro Du Bois, A PALAVRA DO NOME, I)

quarta-feira, 24 de março de 2010

ALGUMAS PALAVRAS

Palavra acalmada
suaves dizeres
sobre o que temos em comum

palavra apaziguada
breves murmúrios
após a carne sossegada

palavra assentada
sólidos conceitos
no que temos de certeza

palavra descoordenada
palavrões no susto do sofrimento

palavra rezada
mágicas orações
após a hora da chegada.

(Pedro Du Bois, ALGUMAS PALAVRAS)

segunda-feira, 22 de março de 2010

SURPRESAS

Das surpresas guarda o espanto
com que se descobre
além do mistério

ileso corpo
sobrevivente
ao instante.

(Pedro Du Bois, DESENREDOS)

sábado, 20 de março de 2010

SERES

Dignificar o nome repetido em ofensas e rearrumar a cama
em manhãs indolentes. Adjetivo e advérbio. Substantivar
o nome ao externo gosto do registro. Dialogar o cedo
ao tarde e se fazer mediano em mediocridade. Avançar
a perna à queda. Ser o anular como prova: ouro
significado e pedra inexistente. Cinzentas horas.
Extrair da memória o fato vendido ao fado. Renascer
na dignificação do nome da família.

(Pedro Du Bois, SERES, 2)

quinta-feira, 18 de março de 2010

RETRATOS

Quem retrata
o momento
apreende a cena
descortinada através da lente

não guarda
em outros ângulos

desfocados

não vê o sofrimento
e a alegria
dispersos em gestos

retratos não vivenciam.

(Pedro Du Bois, RETRATOS)

sexta-feira, 12 de março de 2010

NORTES

Da certeza traduz a dúvida em raios
espiralados aumentando o enfoque
com que a visão avista o corpo
sob a preguiça imensa do instante
traz o circunspecto, maneira escura
de soçobradas escunas em mares
de peixes alvoroçados em barulhos
e mentes devoradas pelas águas

organizado universo de onde somem
as lembranças, resumos e compêndios
traduzem em ilhas a parafernália aberta
aos encontros: nem sempre somos felizes
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. XI, fragmento)

quarta-feira, 10 de março de 2010

ESCREVER

Escrevo de oficío
na necessidade
da mão
ao segurar
o grafite
ao guiar
o grafite
ao riscar
o papel

escrevo fosse a última vez
e minha voz na imensidão do espaço
repete o não que não se avoluma
em sim e representa o fim

escrevo no ofício da repetição do tema
em que tremo a mão que me afirma
em texto tímido de retomada forma

escrevo na saudação do dia
e esse dia não tem fim.

(Pedro Du Bois, A MÃO QUE ESCREVE, I)

segunda-feira, 8 de março de 2010

COVARDIA

A covardia na agressão vazia
com que preenche o espaço tempo de vidas
loucas em opções baratas e embarradas
sujando a entrada e acertando o pássaro
sobre a antena da televisão

a covardia dos falsos profetas
e dos argentários da solidão
silenciosa dos túmulos ocos
sentidos do anoitecer e a rua
isolada em fitas amarelas de acidentes

a covardia dos cantos
em palavras suaves e melancólicas
fosse a oração de outrora
e o dia surgisse da sua vontade

a covardia em si fechada
agrilhoada ao penhasco em disputas
vãs onde se perde em restos de humanidades.

(Pedro Du Bois, O ESPAÇO VAZIO)

sábado, 6 de março de 2010

PRIMEIRO DIA

Primeiro sentido, barulho do corpo na água
com a suavidade do linho, papel transformado
em barco; quedas invertem o movimento
dos mares e as marés declinam; sentimento
conduzido por salas escuras de entretelas;
rebrilha a vontade de ir embora,
através da porta fechada ouve a voz
chamar; está chegando,
não indo embora; vontade espúria
dos contatos; entra na sala e vê
o papel sendo retirado: sua morte
selada recebe o não; está salvo.

(Pedro Du Bois, A DIFERENÇA ENTRE OS DIAS, 1)

quinta-feira, 4 de março de 2010

A PEDRA DESCORTINADA

Não me desobrigo
das intenções
nem me exilo
em praias além
das imaginações
nem me recolho
ao simpático gesto das entrelinhas

as obrigações reverberam
músicas em prelúdios
ouvidos em exílios parcos
de recolhimentos

não me furto
aos olhos imagéticos
dos bruxos que me cercam
em pedras.

(Pedro Du Bois, A PEDRA DESCORTINADA)

terça-feira, 2 de março de 2010

RAZÕES

razões justapostas
ecoam ideias contrárias
nas mesmas vozes
do entendimento
reverberado

cegueira
distância
procura
ajuste
e glória

retornam
apertadas
sacudidas
sujas e rotas
rasgadas

em comportadas razões.

(Pedro Du Bois, COMPORTADAS RAZÕES, V)

domingo, 28 de fevereiro de 2010

A AUSÊNCIA INCONSENTIDA

A morte
decantada
esperada
refugada
em noites perdidas

acordado
evito a sua chegada

o contato:
prévia putrefação do corpo
na hora não apropriada
para a sua entrada

tudo direi a ela
antes complete a sua obra

bobagem, bobagens.

A morte lograda:
sua ação, vazia, termina
na morte: mais nada.

(Pedro Du Bois, A AUSÊNCIA INCONSENTIDA)

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

TODO

(...)

a segunda parte:
do holocausto ao renascimento
sofre a ternura e a espiritualidade
em que se afogam esperanças
e noites se fazem claras
em barulhos aero-rodoviários

três quintas partes:
o inconsciente tem parcela
de culpa no processo e o absolvo
pelo trajeto concluído em conluio
com as tropas adversárias

a penúltima parte:
motores de automóveis inventados
na facilitação das distâncias não percorridas
na juventude e a velhice de refestelados
corpos contra o espaldar dos bancos
e cadeiras colocados em lugares
de fácil visibilidade

a parte oposta:
como reclamar indenizações pejorativas
aos espíritos caricatos dos governantes
que nos despregam de cruzes
sempre que a necessidade
se opõe aos portões abertos?

(...)

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Volume X, fragmento)