sábado, 31 de dezembro de 2011

ENGANOS

Você enganado: a cor da camisa, a dobra da calça,

o sapato desamarrado, a quietude do espelho

transformada no discurso apregoando virtudes

desencontradas; ser o engano não lhe faz maior

que o problema discorrido em tons ameaçadores

e ao longe avista a traição amena das derrotas:

o que leva no bolso lhe faz falta: a carteira

com os documentos, o dinheiro, as chaves irresolutas

das chegadas, o lenço pouco usado no passado



tudo o que tem consigo lhe sufoca, leva a mão

à cabeça e sente o despentear do vento, a dor

inerente ao ouvido, o estalido das juntas; o passo

incorreto da incerteza treme as mãos nos bolsos



você considerado engano terminal das oferendas

e o pacote sob o braço pesa a desdita de pagar

o voto não conquistado; joga fora o embrulho

e segue ao lado da sombra: a sombra o engana.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

SAGRAÇÃO

Nos primeiros tempos

têmpera sobre aço

reforça o esforço

lança ao espaço

o fogo

ardente

da espera

e no terraço

aguarda a volta

do interesse aflito



calcula a área descrita

em versos e do reverso

revigora a alma no cansaço

das esperanças



a conversa ao telefone

direto ao ponto

ao porto

a porta aberta

ao delírio



descreve em arcos o interesse

repentino das refregas

e das lutas intensas

dos incautos

repara no antebraço

com que o vilão

apura o golpe



reescreve e no restante

adianta o sofrimento

do corpo



a dor da memória

onde caninos e dedos médios

indicam o não escutar

do refrão insistente



aporta ao largo e desfaz as ondas

repentinas das saudades

na água cristalina

dos lampejos

e dos reflexos



foge ao primeiro ataque

do esconderijo espia

a poeira cobrir a rua

onde o restante da casa

destruída em ecos

estremece o chão



colabora na velhice com o anteparo

da morte desdobrada

em adeuses

irritantes e inócuos



a idade consubstanciada

na dificuldade

de se fazer ouvir

ou escutar

ou dizer

do passado a história reescrita

em cada época e décadas

decantadas



o alvo fácil dos parques de diversões

em armas virtuais das realidades

anômalas onde derrubam animais

mecânicos e no linguajar aberto

dos desafetos dizem verdades

inoculadas em vacinas

descobertas após

o veredicto



verdadeira é a palavra escrita

riscada em papéis de seda

para que na folha debaixo

fique em decalque

o ressurgir do traço

mentiroso dos regressos.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

POTE

Esvazia o pote
        na mágica
        recorrente
        das tramóias

treme sua mão no vento
e se dispõe ao caminhar
errante dos atrapalhos

ressurge em cada etapa
na descoberta da prata
do pagamento

     do pote vazio quer
     o aroma em bebidas
     evaporadas: a saliência onírica
     do passado, a queda esperada
     das notícias, o levar consigo
     a natureza morta

recorre à mágoa trancafiada
no desvão do espírito: a materialização
da hora na vingança.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 22 de dezembro de 2011

INVÓLUCRO

O invólucro sobre a mesa
                    (no canto da sala)
                    fechado em segredos
                    tateado em dedos
                    desamparados

        aberto ao toque
        mostra o mistério do oriente
        a revelação do ocidente
        o segredo do norte
        o frio inconfessável
        por estar sobre a mesa

                o invólucro
                não recebido

no canto da sala não há mesa
                          não há sala
              há o invólucro sobre o canto
              da mesa da sala.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 20 de dezembro de 2011

OPOSTOS

Não me oponho
às guerras
e aos altos prédios

      sou oposto ao verde
      das florestas impensadas
      e aos azuis corais
      das águas rasas

rarefeito, aspiro a permanência
estonteante das planícies
e retiro da situação antagônica
o refazimento das sibilas

entre frases diametralmente
lançadas ao vento retiro
oposições: das guerras
recebo as últimas horas
e trafego no extremo anel
de angulações e raios

sou oposto raio fúlgido
de desesperanças: o apagar
                        das luzes.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

TEMPO FEITO

Sei fazer. Faço
a canção inerente
ao amor emocionado

desfaço a hora
da leitura e nos textos
guardo letras
inerentes ao fogo

            consumido

sei fazer: desfeito
me reapresento
ao tempo

         e o tempo
         existe.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 15 de dezembro de 2011

RENASCER

Renascido, reapresenta o velho
corpo e o diz novo: come do prato
o pouco da necessidade e bebe
na taça o muito da vaidade: refaz
o caminho das lembranças. Ao novo
cabem conhecimentos antecipados.
Aos velhos faltam razões. Considera
a oportunidade e leva o corpo
ao banho: a água tépica entorpece,
a espuma amortece, o perfume
ilude, a sujeira permanece.

Realimenta a fera encoberta
ao render graças: abraça
os próximos ao aliviar
o rosto em tormento: renasce
na conta de não ter existido.


(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

ENCONTRO

O homem imóvel diante da porta
não responde ao cumprimento

sabe do momento
que se aproxima

reconhece na mulher
de passos rápidos
o encontro

imóvel diante da porta
o homem entende
o lamento subsequente

no bolso repousa a moeda
para o pagamento da viagem

na mão o lenço
com que enxugará
a lágrima de quem fica

a mulher se detém diante dele
e nada fala.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 11 de dezembro de 2011

ESCREVER

Ouve a música
    o vento atravessa
    ares: descoberto
    sofre o conhecimento
    e da música
    aguarda o contexto

ouve a música: lembra
o tempo refeito em cinzas
                   de pensamentos

no ar a música espaceja
e se dilui em tons
                insensatos.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

CONCRETAR

Resseco a planta duradoura
desmancho canteiros
cubro a terra no concreto
mundo do progresso

a terra permancece
na pedra introduzida
em veios de sapatas

a folha
a flor
a essência
o perfume.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

EXATO

Sou a forma exata
da correção formada
na deformação

repilo o incidente
e jogo pela janela
o pássaro desalmado
que invade o quarto

atrapalho o sistema
na elucidação da fala
e digo o que bem entendo

sinto sobre a face o vento
vindo de lá sei onde
porque não assisto
à previsão do tempo

sou a forma exata
na forma afirmativa
da desinformação

repito o ocidente
em viagens intercaladas
aos montes pascais

aproximo incidentes
na consequência
de ensimesmadas paixões
e me faço tolo
de aonde for e vier

sensibilizo o tema
entregue no capítulo
posterior da entrega
e da revelação

sou a forma exata
na afirmação erétil
do projeto canibalesco
da antropofagia

revejo a consciência
mnemônica no tanto
que ouço falar
em sangues e punhais

aliso a fronte em sensações
abatidas dos cansaços
decorrentes do andar

sereno o ânimo do profeta
e alerto o passado
reaberto em inquisições
do que está acertado

sou a forma exata
aproximada ao ato
no embalar a criança
recém nascida
no beço adormecido
de quem sempre faz

remexo em vespas
ao relento
no ferrão instalado
ao me fazer soldado
orador e pai

avivo a pedra
extraída ao veio
cristalizado em tempos
imemoriais

seleciono na companhia
o gesto com que gesto
a fama de mau rapaz

sou a forma exata
na inexatidão do instante
perpetuado ao início.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

CONTROVERSO

No centro a controvérsia instala o medo
do desconhecido: a contestação prepondera
sobre o objeto: a vida apropriada submete
o instante: mágica sobreposta ao tímido
sorriso da moça em afazeres: irritado
pai compreende tarde a vontade
dos filhos: controverso o tema flui
inócuo: resulta vazio: descaracterizado
aos ouvidos surdos dos interlocutores.
Esperar a malícia do convencimento
iludir os fatos transformando coragem
em atos benfazejos: no centro esvazio
a ideia da perda: espero.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 3 de dezembro de 2011

TEMPESTADE

O tempo fechado
em tempestade
abre fresta
ao relâmpago
cortado na incerteza
da passagem

o barulho ao longe
desperta sentidos
de vidas inertes
sob os escombros
concretados dos abrigos

a chuva lava a terra
levada na sobrevivência
exposta no sacrilégio
da palavra dita
em desespero e medo

o tempo fechado na passagem
invade o ânimo e se deposita
por inteiro.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

RETIRAR

De cada morte
retiro
a vida

analiso
em nomes
       datas
    dizeres
e assinaturas

na última vontade
inconsciente
entendo as razões
do silêncio

em cada morte deposito
flores recontadas.

(Pedro Du Bois, inédito)