sábado, 30 de junho de 2012

SENTIDOS

primeira dobra: o dobro do conteúdo
dividido em ares de montanhas
e nos passos rápidos das fugas

segunda dobra: o escopo esconde
a vontade atávica das conquistas
e diz ser a imagem da batalha
pintada longe na descoberta
natural das sensações vazias

terceira dobra: acalma o espírito
na incerteza da conclusão da obra
no sabor do tempo concorrido

quarta dobra: apreende em abraços
a amante e a retira da vida permitida

quinta dobra: o texto desconexo
adquire forma definitiva nas entrelinhas
e percebe a natureza conduzida ao ócio

última dobra: na sexta etapa conclui
a obra no delírio das implosões
em que se liberta de seus medos.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 28 de junho de 2012

DAS NECESSIDADES


Acalento o sonho desnudo
                             do profeta
                             e repouso
                                   aos pés
                                   do cruzeiro

no sul
     ouço o vento
transeunte e o branco da neve
depositada em espécie
           ulterior ao frio

do nada retiro a certeza da crença
e professo desabalada maneira
de me fazer assim

                   no infinito deposito nomes
                   na sagração do antes: pão
                   consagrado na mesa
                   imemorial do homem

(posso - pudesse - acender as luzes
                                           e ver).

(Pedro Du Bois, inédito)
             

terça-feira, 26 de junho de 2012

JOÃO BEZ BATTI

Obtém na pedra
a coloração inercial
do universo

(maneiras diversas
 dos olhares: sangue
 não coagulado da donzela
 oferecida ao sacrifício
 de estar viva: indomada)

raspa a entranha e a delimita
no estrito dever de ser pedra

apedreja a mão que a escala
em réguas: libertam o veio
indelével dos amanhãs

as cores se fazem apresentáveis aos olhos
menores dos interlocutores: palavras
soam porosas em elogios - o bastante.

(Pedro Du Bois, A LEVEZA DO TRAÇO, Edição do Autor)

domingo, 24 de junho de 2012

HÁBITOS

Hábito arraigado: letras coloridas
sobre o fundo (branco) do papel:

     o reverso do poeta
     na profetização
     incolor do horror
                 em se saber
                 encontrado

palavras traduzem o encontro
do papel encarregado pelo voto
de trazer sobre o fundo (branco)
a mensagem colorida

            todo hábito
            se refaz
            em abandono.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 22 de junho de 2012

AINDA, MURILO

Tenho na compreensão do instante
                       o bastante
                       desnecessário
                       ao encontro
         
           tenho no intante a incompreensão
           do pranto
           no espanto
           com que vejo
           o bastante

são palavras, dizem os silêncios
são silêncios, escrevem as palavras

                o bastante do que tenho
                no desnecessário instante.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 20 de junho de 2012

HOJE

Hoje, tempo obscuro, nada além
de traje de banho: a lama
rejuvenesce a face e alisa
a pele endurecida pela idade.
Não torna eterna a feição da fera,
nem faz da continuidade a época
na realização eficaz da peste.
Hoje, tempo obscuro, fechado
à frutificação da espécie,
nada use além da espera dissoluta
da plateia embevecida pela estrela
menor de camarins feéricos: palcos.
Tempos obscuros, templos inseguros
para a idade: nada além da estratégia
de ser o rei da pantomina e o irregular
esteta. Hoje, tempo obscuro, para a mão
que talha em pedra o destino.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 18 de junho de 2012

AMORES ENSOLARADOS

I
Há sol - energia suficiente - e o dia
se apresenta quente: solo montanhoso
indiferente ao clima áspero da planície

II
toldo a luz em cortinas e me deposito
sobre a cama: ainda não são horas
de labutas - o repouso permanece

III
os sons da rua me são percebidos:
economizo os que tenho suficientes
ao propósito de me fazer preso

IV
sei sobre o tempo - que desconsidero -
e da precisão de me fazer inteiro ao dia

V
uso de artimanhas: dias se alongam
em compromissos e meu amor dorme
em sumiços: o corpo permanece

VI
há sol e mesmo que não veja sua luz
me indireito na cama e observo a espera
em retirada: amores são assim (quase nada).

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 15 de junho de 2012

FUNDO

O fundo do mundo
(espaço intergaláctico
 desprovido do humano
                                ser)

acontece no contato
com a espada

(o escuro da matéria: imaterial
 escudo na proteção do espaço)

empunho a espada
e luto: a luta acrescenta
a ilusão da farsa

(invento o espaço discordante
 entre o aqui e o longe)

de que o mundo no fundo
ostenta eventos felizes

(felizes como os consideramos
                                          aqui).

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 13 de junho de 2012

ORFANDADE

Nascido órfão
na posteridade
da espécie
          entendo a solidão
          do espaço
            vislumbrado além
              da salvação

(que espécie órfã é capaz
 de criar a sua salvação
 e matar na continuidade
  da culpa?)

nascido órfão
me digo só
em sacrifício.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 10 de junho de 2012

SURPRESA

O elemento surpresa onde se escondem
as mudanças. O estertor com que  fogo
queima o estrado e o preso se arrepende
em novo ano. Não reconheço a espera:
                       o esperto acreditar
                       no futuro: o inexplicável
                       alvoroço do cão: o amargo
                       da vida na ilusão passageira
                       do amigo. Folgo em me colocar
contra a janela: inocento o suspeito. Suspeito
de outras eras: chego sem ser anunciado.
Desdobro a canção dos horrores
consumidos em preitos
                    panelas
                e tigelas. O elemento
e a presa na hora em que o circo
pega fogo e o mundo se desmantela
no imitar do bandido ao espoucar
da pipoca: a chave em giro
mecânico na porta.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 8 de junho de 2012

IMAGINAR

Construo a imagem
ao arrepio do espelho
a lâmina assusta
o rosto que se desfaz
em gritos ante o dia
que se abre ao mito

       minto cada leve dobra
       do espírito: aumento
       a expressão e o riso

o espelho desmente
a impostura do porte

em dinâmico gesto
destrói o sonho
onde me encontro

     contruo outro corpo
     e não me arrependo
     na informação errônea
     da identidade: quebro
     o vidro e ao lado vejo
     que a estrutura mente.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 6 de junho de 2012

CONFISSÃO

Ao pássaro confesso minha incerteza
 ao pé do ouvido grito meus pertences
e o preço pago em cada compra: vendo
a alma em desavenças. Calo
a inconsequência do canto.
    Ao pássaro não ofendo o silêncio
    em alardes frios de sofrimentos:
              o ninho por manter
                 a cria por alimentar.
                                       Incerto
     encaminho a voz ao segredo
revelado em poucas palavras.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 4 de junho de 2012

EM LIBERDADES

Como me visito na liberdade onde fujo
ao extrato - estrito senso da razão -
aventado sobre flores
                    guerras
               saudades
e manhãs explícitas: o sexo carnal
descarna o corpo no arrepio final
do gozo: ânimo revisto
no pranto do menino - por isso
me visito em liberdades tardias
                juventude embalsamada
                rito fúnebre contratado
liberdade desconsiderada no jogo
da apatia
     simpatia
     a alopatia remedia
o gesto (ainda) preso: o peso
dos anos condenam ao suplício:
de onde retirar o fragor da batalha
                        o fulgor da hora
flores despetaladas rejuvenescem caminhos
em dias santificados de obrigações imemoriais
em estranhos sonhos: visito-me na liberdade
de colher frutos amadurecidos: tempo
oferecido em perdas entre grades.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 1 de junho de 2012

PRESENTE

Sou visita e residente

passado aparente
em nova visita
e o de sempre

o mesmo: quem
conhece o caminho
entre o quarto
         e a cozinha

vida renovada
na morte persistente

a oração em sofrimento
na brisa mensageira
da notícia

o de fora e o de dentro:

                  filho
                     pai
               marido

esquento o trabalho e saio
                             passeio
               troco de lado
e me escondo em periferias

quem vem de longe
para ver a família.

(Pedro Du Bois, inédito)