quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

FLEXÍVEL



Ser flexível
vergado pelo peso
socialmente exigido
mulher e filhos
parentes
fornecedores
clientes
patrões
amigos

a igreja pede
seu dízimo
o pobre pede
na esquina
o estado pede
sua parte
a vida cobra
sua sina

flexionado ser
verga o corpo
sob o peso
dos anos quebrados
em tantos afazeres.

(Pedro Du Bois, inédito)


terça-feira, 28 de janeiro de 2020

PROCURA



Meu espírito
procura teus pés
os pés são fundos

teus olhos cravos
tua voz é nada
teu corpo o todo
que não se apresenta

presente no que falta
nos fundos à frente
o que não vês
ou sentes

meu espírito
procura tua vida
a vida é curta.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 26 de janeiro de 2020

TRABALHO


Trabalho
outra tarefa
das tantas iguais
e repetidas

todo dia acorda
todo dia pensa
todo dia escreve

todo dia apaga
o pouco da realidade
que pressente

trabalho repetido
em lendas
nas histórias
(mal)criadas.

(Pedro Du Bois, inédito)


sexta-feira, 24 de janeiro de 2020

(RE)COMEÇAR


   Erramos o caminho no começo
   fomos em frente sem destino
                 qualquer trajeto nos serviria
   (mesmo) errado como vimos adiante

   sem passagem
   sem paisagem
   sem paragem
   e paradeiro

   água escassa
   animais famintos
   dores pelo corpo
   malditos insetos

   tentamos voltar por onde fomos
                    erramos o caminho
            não estávamos perdidos
        (apenas) não havia sentido
              retornar seria o destino.

   (Pedro Du Bois, inédito)

   

quarta-feira, 22 de janeiro de 2020

HISTÓRICO


O histórico carrega
a nossa vida

organizada pasta
repleta de fatos
(ultra)passados

quem somos
desde o início
o que fomos
nos últimos tempos

traz espaços em branco
onde poderíamos colocar
quem nunca somos: talvez
a verdade da nossa vida.

(Pedro Du Bois, inédito)



segunda-feira, 20 de janeiro de 2020

meiotom poesia&prosa

Segredos, em:
http://www.meiotom.art.br/dupo19segredos.html

ESTÁTUAS


Mostravam o caminho na ponta dos dedos
apontavam a estrada e diziam por ali
chegarão ao deserto de pessoas arenitos
e encontrarão a cidade de concretas pessoas

não havia alegria no que mostravam
olhavam para trás como a dizer voltem
retornem seus caminhos de vinda
não se curvem ao desconhecido
- mesmo que novo - fiquem
com o que tiveram em vida

avançamos desprezando os sinais
focamos os dedos assinalados
em lugares descobertos ao acaso
teríamos o encontro e desmoronaríamos
estátuas de areia sob a água

eram estátuas os homens arenitos
eram concretos homens as estátuas.

(Pedro Du Bois, inédito)



sábado, 18 de janeiro de 2020

Arcanos Grávidos

Respostas, em:
https://arcanosgravidos.blogspot.com/2020/01/respostas.html


FASCINAÇÃO


Não me convidam para a viagem
nem faço companhia a quem fica

sou sozinho entre sair e ficar
sou aquele que sai sem ficar
                         e fica ao sair

nem lá nem cá
sou fechado em mim
nos sons externos
e murmúrios internos

de tudo dou ciência
de todos sou constante

a viagem não me fascina
quem fica não me fascina

o interior é fascinante
e me pertence.

(Pedro Du Bois, inédito)



quinta-feira, 16 de janeiro de 2020

BIOGRAFIA


Sua biografia apresenta
as etapas permitidas
pela publicação

muito trabalho
algumas trapalhadas
sucesso

(não lembra a biografia
 de pessoas comuns)

seus olhos encontram
na história o instante
em que o mundo
se revela em si

(não lembra de leituras
 sobre a vida dos vizinhos).

(Pedro Du Bois, inédito)


terça-feira, 14 de janeiro de 2020

Arcanos Grávidos

Eco, em:
https://arcanosgravidos.blogspot.com/2020/01/eco.html

VENDAS


Vendo a alma
em recorrentes negócios
drogo o espírito fecho os olhos
tenho a paz do momento

dura pouco o meu estado
desperto e o gosto aperta
a boca o estômago o cérebro

vendo a alma
recorro aos negócios
não troco a minha vida
pelo sucesso

dura pouco o insucesso
busco na venda a volta
dos pequenos momentos
de olhos fechados

vendo a alma
o corpo paga a conta.

(Pedro Du Bois, inédito)


domingo, 12 de janeiro de 2020

ENTENDER


Perdido em meandros burocráticos
sou quem não entende a família
como famigerados seres
armados até os dentes

o espetáculo empobrece o espírito
luzes fracas desfocam imagens
e o picadeiro esconde
minha falta de vontade

disfarço o cansaço na surpresa
pelo resultado pífio: a guerra
se intensifica: sou o outro
lado: escuro em mim mesmo

sou em silêncio o passado de glórias
e entrego a bandeira dobrada em leis
antepassadas: sou o primeiro prisioneiro
na árdua batalha em que enterro
os amigos quando vão embora.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 10 de janeiro de 2020

RESPOSTAS



Todas as respostas
constarão do arquivo
que nos será entregue

na sua leitura
gastaremos nossa eternidade

tanto não precisaríamos ter feito
quantas dúvidas não deveriam
                     ter nos consumido
                     algumas maneiras
                     estavam certas
                     incorretas foram
                                 as escolhas

fecharemos o arquivo
como o abrimos: sem
o tempo da conquista.

(Pedro Du Bois, inédito)




quarta-feira, 8 de janeiro de 2020

meiotom poesia&prosa

Desaparecidos, em:
http://www.meiotom.art.br/dupo19desaparecidos.html

APRENDER

Éramos iguais
fôssemos feitos em série

impacientes
tínhamos a sensação
do novo em repetições

o mundo em nossas mãos
como Carlitos na sátira

éramos todos
exceto os envelhecidos
em pouca idade

nossos fatos
            fátuos
            olhares perdidos
                          no horizonte

tantos foram embora antes do tempo
que mudou nossas palavras.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

MEMÓRIA


Meu tempo é pouco
antes cheguem
raivosos seres

destruirão o feito
recomeçarão trabalhos
alterarão estruturas
em diuturnos recomeços

antes cheguem
suas picaretas
guardo em olhos
memorizados
a natureza feita

sou memória
destruída sempre
em raivosos atos
de progresso.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 4 de janeiro de 2020

HORAS

Horas arrastadas
na vida suspensa
em outra hora
com mais tempo
para a passagem

horas arrestadas
à morte que não
as quer de volta

diverte-se com sua angústia
por permanecer vivo a ouvir
o passar do tempo
já sem memória
    sem amor
     sem outra mão
      sobre a sua

horas eternizadas
em quem não vai
embora: quem se repete
    no que repele da vida.

(Pedro Du Bois, inédito)


quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

RETILÍNEO

Sobre a amurada
faço parar o tempo
ontem acontecido
no amanhã entrevisto

parado: hoje represento
a última cena na vista
descortinada da vida
encoberta em ruínas

antes cinzas queimem
minhas asas frágeis

sobre a amurada
suspendo as horas
em que o momento
desfaz a vontade

o corpo pende
retilíneo.

(Pedro Du Bois, inédito)


Revista Cerrado Cultural

Sorrateiro, em:
https://revistacerradocultural.blogspot.com/2020/01/sorrateiro.html