quarta-feira, 10 de março de 2010

ESCREVER

Escrevo de oficío
na necessidade
da mão
ao segurar
o grafite
ao guiar
o grafite
ao riscar
o papel

escrevo fosse a última vez
e minha voz na imensidão do espaço
repete o não que não se avoluma
em sim e representa o fim

escrevo no ofício da repetição do tema
em que tremo a mão que me afirma
em texto tímido de retomada forma

escrevo na saudação do dia
e esse dia não tem fim.

(Pedro Du Bois, A MÃO QUE ESCREVE, I)

Um comentário:

  1. Da mesma lavra temática...

    LIRA PERDIDA

    Na página adiante, a fria alvura
    É um mar de tão branca secura
    Que por tal palavra me faltasse
    Na letra ausente eu me afogasse

    E tateio, adivinhando a tessitura
    Se dela inda estivesse à procura
    Qual se a mim mesmo buscasse
    Num travo à língua, um impasse

    É que falta a cor, se oculta a face
    E o próprio verbo criador descura
    Qual se do fiat lux se ausentasse

    E clama a metalingüística lisura
    Na folha maculada, em sua alvura
    Que eu a mim mesmo edificasse

    Francisco de Sousa Vieira Filho

    ['sede oleiros de vosso próprio barro.']
    ----------------------------------------------
    ATHENE NOCTUA*

    Ah, poesia, linguagem caprichosa!
    Do bom-ócio grego, o farto ventre
    Dúbia e faceira, mansa e chorosa
    Qual se nos achega quase sempre

    Em sua dança geniosa não se curva
    E se ao bel sabor o sentimento turva
    Mal se presta a falar o que só pode
    Cantar o coração em cifrado códice

    Suas belas asas não deixa vergar
    A quem só dela foge, se a pretende
    Esforço vão, a vil noção conceituar

    E em seus profundos olhos tende
    Se co'a Filosofia alça vôo acúleo
    A desbravar o horizonte cerúleo

    Francisco de Sousa Vieira Filho

    FONTE: VIEIRA FILHO, Francisco de Sousa. Lira Antiga Bardo Triste. Teresina - PI: Gráfica e Editoria O Dia, 2009. v. 500. p. 14.

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