terça-feira, 26 de abril de 2011

BELEZA

              Saciado
              protegido
              satisfeito
              em necessidades

                                     
olha além
          estrelas
          noite
          sol
          calor

vê a beleza das flores
                           matas
                           águas
                           animais
                           pessoas

enfeita-se
e imitando o vento
canta e dança.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 23 de abril de 2011

ÚLTIMO GOLE

Quantos interesses sustentam
a amizade?

Pode a amizade sustentar
os interesses?

Mesa dos fundos
copo meio vazio
e a bebida quente.

Quantas amizades sobrevivem
aos interesses?

Pode o interesse desabrochar
em amizade?

Último gole
e a garrafa vazia.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 21 de abril de 2011

PLANOS

I
Ignorado espírito de luzes: é o alvorecer,
não o dia em plenitude, milagres favorecem
os seios da mulher amada, ódio sobre a pedra,
o óleo derramado aos poucos queima
a vela que se apaga em si, escuro substituído
pela aurora onde se apega e reza a primeira prece

ressurgente: manhãs quente de verão,
inquieto ser ignora as regras e se declara
senhor e varão, servo mais servil, imprestável
figura rastejante aos pés: o soberano conhece
no fulgor a raiva e o repele em imprecações

aonde o leva o corpo em fuga, desertos
e recantos do cérebro a maquinar
a volta; na revolta dos dias pensa entender
a lógica da conquista, aprende errado o lado certo
e debruçado sobre a encosta procura o vento

lamento em ecos, repetidas palavras em tons;
no final da vista o horizonte esconde o segredo
do encontro; desencontradas orações esquecidas
entre o microcosmo da vingança e a sanha assassina
onde passam lanças fixadas em corpos inocentes;
o preço da vitória é morte insensível

aquece a lâmina enterrada no peito como verdade
ao desafeto; sua ignorância exige os passos, agita
o frasco e bebe o começo; não há mais do que isso,
sabe o bastante para qualquer ato de barbárie
na intenção dos deuses apequenados em suas bases

II
sente o cheiro ruim do esgoto, seu corpo decomposto
em fezes; urina escorrida pelas pernas dilaceradas
em feridas; a derrota representada em essência
fossem perfumes caros; a escuridão difama
o catre do apagado ser em esquecimento

seria diferente fossem seus irmãos soldados, não pobres
coitados iguais em ignorância e ganância; diabos vencidos
em cansaços e mal feitos; armas descarregadas em medos
de sombras e sutis diferenças entre a pedra e a mata, olhos
embaçados de burguesas vidas sem o brilho letal da coroa

rei por um dia, tempo exato da confirmação e discursos;
banquete entre mesas, vinho fácil em cálices;
esplendor e glória no instante do reconhecimento;
nuvens ante os olhos, cegueira instantânea do sucesso;
não devia ter prometido a partilha

o aparelho cede ao contato e a roda gira o corpo
que se espreme entre o concreto da madeira e a pele;
o espaço cede ao encontro do que sobra: quase nada
da vida exposta aos algozes: seus olhos não vislumbram
o conteúdo das orações e o carrasco grita suas verdades
e as que o condenado deve contar, repetir e assinar
a confissão e o fim é abreviado, suas dores terminam
no fragmentar dos ossos e esmagamento dos órgãos:
tudo é finito repete o religioso que acompanha
a súplica e suas mãos, ausentes, dizem da impotência

III
há a redenção das almas, o dia límpido e branco
das promessas e a eternidade exposta em líquidos
clarificados; cores presentes diante dos olhos
reabastecidos de bondades; tardia hora
da confissão e do perdão negado

da vida nada leva, o material esgarçado dos panos
abertos ao público e mostrado o vazio,
insuflada a multidão repete a cena; fecha os olhos
aos incautos passos e a cruz é passada de mão
em mão; pecados pregados na madeira; o todo
e o nada na elucidação dos tempos; mantenha
a vista no horizonte, de lá surge o outro
instante, a nova direção e a dimensão posterior

iguais em ideias, o amor varia na intensidade
dos encontros; palavras entendidas no princípio
do novo tempo; a palavra envelhece de imediato;
a igualdade significa a continuidade do nada
e o predador se opõe ao encontro; dele
o seguimento da batalha em novos palcos

IV
após a hora da vingança encontra a calmaria dos barcos;
surdo, não ouve o canto das sereias; cego, não as vê
sobre as pedras; bruto, esquece as pedras e delas não
tira proveito; primitivo, mantém o hábito e os gestos
no discurso repetido: o amor, o amor, a romã rompida
em sua casca e a imperial cidade, Roma, ainda e sempre
vencedora do tempo e dos espíritos; mesmo que não
tenha estado lá, e que a cidade não mais exista, sabe
a marca da conquista: a primeira, e a primavera não
esquecida; orgulhoso, exibe o que sobra do corpo
e as mutilações servem como abrigo para novas
guerras e palavras vãs em esforços

V
amigos de infância trazem os presentes
ávidos da entrega em holocausto; são permitidas
introduções e modificações diversas; castigos
a que são submetidos os vencedores;

hoje o mendigo tem seu quinhão e moeda; amanhã,
na aurora, em outros campos e os raios de sol
banharão as faces desnudas ao enfrentamento
de desconhecidos e ignorados seres;

másculas espécies, novamente a espada e o canhão,
o avião em sobrevoo das terras arrasadas, olhos
eletrônicos e pés mecânicos do aparato que avança
em deslizantes saltos; os primeiros a ficar com o quinhão
do assalto: mulheres e crianças,

retorna ao tempo de espaços vagos em vitórias;
aos vencedores a acolhida e os escolhidos
gozam benfeitorias e silêncios posteriores;
o direito de não ouvir os gritos dos feridos
e as blasfêmias das famílias; mares cobrem
as terras próximas e os corpos em magia

VI
certo, disse o homem após tudo ouvido, os planos são perfeitos
e a música da vitória toca em nossos corações; tenho receio
do imprevisto, do imprevisível e da incompreensão das partes;
podem fazer perder o encanto e fagulhas queimam capítulos
das histórias; do que sobra, fragmentos e papel e letras
é impossível fazer valer a nossa vontade: estamos mortos.

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. I, Edição do Autor)

terça-feira, 19 de abril de 2011

ARES DA TERRA

O rio da minha infância
passa longe
da minha pequenez
e do medo de ir até ele
e me banhar

o banho fechado
no pecado de estar molhado

quanto mais perto chego
mais o rio se faz longe

hoje há a ponte
e sob a ponte
entulhos e detritos

a rio da minha infância
estrangulado em papéis
assoreado em seca lembrança
do que não foi longe
e perto.

(Pedro Du Bois, ESPAÇOS DESOCUPADOS, Edição do Autor)

domingo, 17 de abril de 2011

FUTEBOL

Mesmo frio
o suor escorre o rosto
lívido acompanha
o caminho da bola
na elegante passada
do craque

mais uma vez
falha finalização
e a bola
acaba nas mãos
do goleiro

o tempo passa
o suor aumenta
pupilas se dilatam
tentam ajudar a jogada
da equipe

zero a zero
como se não tivessem jogado.

(Pedro Du Bois, O MOVIMENTO DAS PALAVRAS, Edição do Autor)

sexta-feira, 15 de abril de 2011

NÚMEROS RECONTADOS

Nos olhos tristes
rosto abaixado
a certeza de que algo
                    vai mal

o namorado pressiona
a família responsabiliza
                    ponto final

como escapar aos vinte anos
com nada pronto
e tudo por fazer

mentiras
fugas
   novos caminhos

a necessidade quieta
                    e soturna.

(Pedro Du Bois, NÚMEROS RECONTADOS, Edição do Autor)

quarta-feira, 13 de abril de 2011

EQUILÍBRIO

Barco em balanço
           contra lado
              equilíbrio

saber na água
enquanto o barco avança
        como manter o equilíbrio

como a vida em terra firme
              contra lado
              em equilíbrio.

(Pedro Du Bois, POUCAS PALAVRAS, Edição do Autor)

segunda-feira, 11 de abril de 2011

A OBRA NUA

Primeiro Ato

Concreta terra: abstrato
do que havia sob as ruínas
e o tilintar dos copos
          brindam
          a obra
          construída.

No futuro inexistente obras
primas encobertas em tintas
momentâneas e o desprazer
da descoberta revelará histórias
em fragmentos. A nudez
                         da estátua.

(Pedro Du Bois, A OBRA NUA, 1º Ato, 7, edição do Autor)

sábado, 9 de abril de 2011

A CASA DIVERSA

Precedente, pastéis de Santa Clara,
antecedente, pastéis de Belém;
com cafezinho passado na hora.
No cd player o vocal do Nossa Voz.

Lá fora chove,
raios e trovões,
ventos e ventanias.
Espero que amanhã melhore
e que possa sair de casa.

Seja no presente,
aqui, agora, no momento depois.

Pastéis de Santa Clara,
pastéis de Belém.
Que chova lá fora,
aqui fique tudo bem.

(Pedro Du Bois, A CASA DIVERSA, Edição do Autor)

quinta-feira, 7 de abril de 2011

O NOME PROVISÓRIO - 6

Quando mudaram o nome
discursei palavras de abandono:

               alguns acharam bondades
        explicitadas. Alguns nada encontraram.

               As mudanças distanciam
               os corpos sobre o nada
               efetivado. Assustam
               as pessoas em medos.
        Amedrontam aventureiros recrutados
        em cinzeiros. O cheiro oxida
        o título. A legenda acompanha
                     o ressentimento embutido
                     no dizer do nome.

(Pedro Du Bois, A PALAVRA DO NOME, Edição do Autor)

terça-feira, 5 de abril de 2011

LIBERDADE

Mito
dédalo
asas de cera
derretidas
em Sol

o mito
busca a liberação
do corpo

desdenha deuses
esquenta ares
derruba dédalos

impede a libertação.

(Pedro Du Bois, LIBERDADE, 5, Edição do Autor)

domingo, 3 de abril de 2011

CICLE


Fet mortal

en la forma amb què es presenta

                               explota vides


             carrega i alberga

             la infinitud


en la mort desconsidera

el cos: lliura a la decomposició

                                  la carcassa              


        i sobreviu en membrances.


(Pedro Du Bois, inèdit)

- Versão para o Catalão, gentileza do poeta Pere Bessó
   http://perebesso.blogspot.com/2010/10/poema-de-pere-besso.html

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CICLO

Feito mortal

na forma com que se apresenta

                            explode vidas


          carrega e hospeda

          a infinitude


na morte desconsidera

o corpo: entrega à decomposição

                                       a carcaça


         e sobrevive em lembranças.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 2 de abril de 2011

CICLO UM

Mina aberta
montanha desbastada
rejeitos
        monturo

de tantas desgraças
é feita a vida

amores passam
nas águas barrentas
descem o restante
da montanha

limpam suas águas
nas margens passadas
e deixadas em barro

embaixo: límpida
cristalina empoça

em descargas
no recomeçar
o ciclo.

(Pedro Du Bois, PORTAS E VENTOS, Edição do Autor)

sexta-feira, 1 de abril de 2011