sábado, 31 de março de 2012

ARMAS

Reponho a arma
deponho a raiva
o medo sobressalta
o corpo: treme em fracasso

guerreiro despido reflito o espelho
alterado: imagem insolente
da batalha desguarnecida

           oca arma repousa
           sua imaterialidade.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 29 de março de 2012

QUESTÕES

Em razões irreais
busco na essência
da questão o alvoroço
das respostas

faço a tolice de me dizer alerta
e do âmago da vida
- amargo discurso -
quero a solidez da palavra
em circunspecta frase

avanço as mãos sobre o corpo
desnudo e refaço a importância
da luta: ao lado repousa outro
corpo adormecido. O corpo frio
das entregas insones. Na irrealização
dos aspectos confusos das respostas
a inexistência da questão me transforma
em ruína e cadáver.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 27 de março de 2012

DIFERENCIAÇÃO

Heróis inexistentes simbolizam
           glórias não alcançadas
           pela divindade obstruída
           na condição terrena

heróis mundanos conservam
da divindade a ânsia
de etéreas transfigurações
dos deuses destituídos
da glória inalcançável

desfeitos em remediadas vidas
gestam arremedos de redescobertas.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 25 de março de 2012

PARTIR

Quando parto na imensidão do microcosmo
me faço longe em desalentos; partidas quebram
correntes e me impelem além dos remos; ramos
esgarçam a árvore desnuda no solo, seco. Eu
na última volta do acaso me faço calado ante
o espetáculo do corpo suado ao luar; viagens
soam invernais trajetos de encobrimentos,
mãos umidecidas do trabalho guardam bolsos
descosturados: partidas me apanham de calças
curtas no aroma indefinido da criança além
da criação, impaciência. Sou o último a ver
o esboço se perder; partidas orientam
desvarios onde razões perdem o magnetismo
e a terra roda ao contrário: avistado na entrada
me faço raivoso. Estou presente no esconder
o sentido da ausência; a partida pressupõe
o adeus não amanhecido; altar vazio,
armário esvaziado, o viver
apagado da lembrança.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 23 de março de 2012

HOJE

Hoje em portas abertas
fecho o sentido; sem contato
apago o trajeto; sem o agito
quebrado dos pedaços colo
a imagem ao sentido e repito
antiga música romanceada
em estradas percorridas; hoje
certo do regresso posto-me
à porta e com olhos de aguardo
anseio a visão do vulto
no alongar do trajeto; hoje
em respeito devido acolho
dúvidas e as espano
em limpas diretrizes; hoje
absorto na realidade da casa
fecho as portas e me recolho
no instinto anterior aposto
ao dia interior do futuro.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 21 de março de 2012

BREVIDADES

1


Permito-me a lucidez: vejo a árvore e os frutos;

desfaço a cama e guardo as cobertas. Visto na roupa

a imagem trazida no regresso. Da casa retenho

a tinta das paredes; nos vidros da janela vejo

a poeira acumulada. Recorro à figura armazenada

e retiro a essência. A lucidez me repete

fatos intercalados.



Invado o lúdico e me deparo com a reserva

ao conhecimento. Cumprimento a sombra

do que sou e deixo arrolado o tanto procurado.



A lucidez contém luzes enfeitiçadas de verdades.

A lucidez é meu cansaço.

(Pedro Du Bois, em Brevidades)
 
Meu livro, BREVIDADES, editado através do Projeto Passo Fundo, com prefácio do poeta amazônico Jorge Tufic e comentário (orelha) do professor e historiador Paulo Monteiro, será lançado em Passo Fundo, RS, em 19.04.2012, na Livraria Nobel (Rua Gal. Osório), a partir das 18 horas. Como o convite ainda saiu, valho-me deste espaço para convidar a todos. Desde já, agradeço.

terça-feira, 20 de março de 2012

BELEZAS

Para que tudo (paisagem
                    passagem
                     olhar
                       estar) fique
como quero, o trabalho
se faz barulhento
              irritante
              impertinente, ao olhar
                                    escutar
                                    sentir no ar
                                    a tensão das mãos
                                    o gesto no braço
                                    o suor pelo corpo
                                    a poluição nos olhos

(disposto em linhas sucessivas
 disparo contra os inimigos
 que revidam meus gestos
 em pé de igualdade).

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 18 de março de 2012

POEMA

O poema contempla o erro
                           de ser grafado
                           em descobertas

           inibe a mão
           que o traça

a revelação extrapola
o átimo da conversa.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 16 de março de 2012

ARRANJO

Apesar do passado
vê o mundo
ante olhos avermelhados
do começo: flores amareladas
           folhas cinzentas
                 caules esverdeados: vaso
quebrado pela base.

Ultrapassa sua voz no contato
e na parede do quarto reverbera
o pedido: ar respirado
no prazer de estar ali
situado na amplidão
refeita do passado.

condensa o mundo em águas e luzes
multiplicadas multiplicadas
                multiplicada
em arranjos finais: infrutíferos.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 14 de março de 2012

VIDAS

A história apreende no detalhe
                                  o todo:
                                  nada rememorado
                                            em verdades

     nada reverberado
     em tocaia armada

               atalaia agreste
               de indomada palavra:

palavreado falso com que se irrita
a fêmea desprestigiada. Desalento
aguardado na fresta da fornalha.
Vulcão inacabado em beiradas.
Verbo reduzido no gesto
     com que armam as lutas:

    todos esses anos resultados
    em fases de miséria.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 12 de março de 2012

PAGAMENTO

Ao interlocutor digo sobre a ausência
das sementes lançadas pelo caminho,
do rastro deixado em terra fina,
na grana verde pisoteada: sobre meus
sentidos ignoro o rumo, do traço
apago a passagem. Da espera me digo
anômalo peregrino e do amor
- no plural - acho meu canto: minha vida
consentida é esboço do mundo amarelado,
velho para aventuras, fundeado ao largo,
submerso em pontes, decodificado além
das paixões em ruínas havidas da casa
adquirida em anos perdidos da família
na comiseração do corpo. Como cidadão
trago o mudo grito de satisfação e honra.
Da guerra a medalha circunscrita ao peito.
Sou ninguém e aos ouvintes - poucos -
declamo a vida em versos. O restante
pago pelo prato de comida.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 10 de março de 2012

VIVER

Não deixam
sua morte
expiar a culpa

fica vivo
e os dias passam lentos
em calendários repetidos

dizem da sua vida
o erro cometido
estão em sua porta
aberta ao mundo
real das entregas

pede à morte
o descanso
e tem o trabalho
das bruxas estéreis

estar vivo é a morte
resumida.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 8 de março de 2012

INSÔNIA

Noites sucessivas de amores
em restritos corpos sobre a cama

a história reiniciada
em novo porto de partida
a hora repetida em personagens

a insônia em razões
para o encontro
da vida recebe
            destaca
            o porto
onde aportam
mentiras

porto referendado
no espírito condoído
dos regressos.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 6 de março de 2012

ÂMAGO

Do âmago
a terra
expele: águas esquentam
            corpos além da idade

        radioativas
        geotérmicas
        decompostas em curvas
        no encontro com a superfície

agudo sentimento da velhice
escancarada no sonho da partida

na água vulcânica repousa
o corpo suspenso ao ocaso
                            do sismo.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 4 de março de 2012

ESPREITAR

Espreito: verde mar
amanhecido em ondas diminuidas
em luzes: barulho sobreposto
no nada traduzido pelo vento

guardo os olhos e longe
vislumbro o cardume

agito as mãos
e o cardume singra
fora da baía

retiro a venda: vivo
me ultrapasso e levo o grito
mudo com que o peixe
                        um só
salta sobre a onda e retorna.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 2 de março de 2012

REFAZER

Refaço os sentidos
na angularidade do espaço

      tempo imemorial
      sobreposto em crestado
      corpo na absorção do plano
      inadequado ao estudo

espero e abro oferendas
desfeitas em sentimentos

no ângulo providencial
das diferenças
                  refaço o sentido
com que me mantenho vivo.

(Pedro Du Bois, inédito)