terça-feira, 29 de setembro de 2020

Arcanos Grávidos

 Bastante, em:

https://arcanosgravidos.blogspot.com/2020/09/bastante.html

SÓCIOS

 








Associado ao doge de veneza

me faço estampa e quesito aberto

em contendas: respondo sobre a água

e o limo invade a casa: retiro da questão

                a lógica e alço a torre ao limbo

                inalcançável da maré entrante:

                  tenho nas mãos as respostas

                e a corda cede no que o corpo

                  ascende ao extrato do ultraje.

 

Sou sócio oculto pela veneziana

entreaberta ao odor lamacento:

minha parte se resume a ouvir

os remos na água e o rumo

sob a água: águas paradas.

 

Na escadaria da casa alagada

ressurgem ratos dados como mortos

e aranhas ditas desaparecidas: o afresco

das paredes cede à umidade e descasca.

 

Debaixo do desenho pueril da oferta

surge indelével a parede nua.


(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 27 de setembro de 2020

SUCESSÃO

 








O senhor daquelas terras

amaldiçoou a cerca arrebentada

maldisse o gado ultrapassado

reclamou a guarda dos cachorros

dos empregados a presteza

à mulher disse horrores

pelo almoço não servido

dos filhos abusou do riso

com que diminuiu a todos.

 

Em cada incerteza brotou

a dúvida ensimesmada

e o senhor daquelas terras

nelas foi enterrado.


(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

DEPOIS

 








Depois: irmanado em tanques

de tiros desajustados invado a obra

e retiro dos escombros o motivo

preso ao desafio de pazes descumpridas.

 

Declaro guerras aos insanos tímpanos

insistentes em músicas e letras no artifício

de transformar barro em coisa: coisificar

a pedra: estátuas acompanham a passagem

e me entregam com a falta de respeito: quieto

e saliente permito o passo da conquista.

 

 Depois: interrompo a luz e me desfaço na poeira.

 Exalo suspiros de vingança e ao perceber a falha

 pego no ar a fragrância daquele corpo de mulher.


(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

CHEGAR

 








Peço desculpas

pela maneira amarga

com que sou acolhido

 

     o gesto recolhido ao mínimo

     necessário: o olhar perdido

     pelo corpo: a voz inaudível

     dizendo algo

 

                  chegar exige vontade

                  e a necessidade

                  adensada no caminho.


(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 21 de setembro de 2020

BASTANTE

 








Basta

- no arremedo improcedente

  das ausências me apresento

  à luta: ponto

 

sou o novo soldado

engajado em guerras

vespertinas: compro

 

repentinamente a hora cheia

avisa sobre o corpo: velho

 

a mecânica do mundo estraçalha o sono

o aviso na porta indica a saída

 

basto em mim mesmo

que essa luta não é minha.


(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 19 de setembro de 2020

ARDER


          


                








               No peito
                   o ardor
                   com que a entrega
                   se faz rubra
                   em cores de paixão

            consumir
             e ser consumido
               em arroubos

         roubar ao coração
         a razão da entrega

a irracionalidade amadurecida
no cadafalso: viver
o instante e nada receber
em troca.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 17 de setembro de 2020

INFINITA













Infinita hora
dos discursos: o povo vota
em depósitos entreabertos
no que chamam participação
em gesto democrático

            aciono a tela e a deprimo
            em teclas enumeradas
            com fotografias antigas

    emerge a conversa fiada
    e troco um pelo outro
    - de mesmas coisas.

Assino a folha e me declaro
afirmação errônea
do destino: o infinito
refulge nuvens
maquiavélicas.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 15 de setembro de 2020

OUTRO













Outro se faz em ventos
redemoinhos e calmas brisas
alisam a terra em que a poeira
deixa rastros: outro altera
a direção e o percurso
aplaude o percorrido em ofertas
de bons dias: outro se faz ingênua
loucura e espantalhos falam
de ouvidos anteriores: antes havia
o tempo disponível ao encontro
das línguas atravessadas em beijos.
Outro desfaz os nós e desenrola
a corda amarrada ao cadáver.
Após o tempo a hora se perpetua.
Outro retribui o gesto acondicionando
láureas vencidas no ódio estremecido
ao ganhador do ócio: outro esquece.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 13 de setembro de 2020

SOMBRAS













A sombra projetada
                
                 (solo retirado
                     ao encontro)

               esconde inverdades

               (solo recomposto
                   sob os passos)

              reaparece em luzes
             
              (solo reapresentado
                  enquanto sombra).

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 11 de setembro de 2020

DIZER













Dizem
de mim: pródigo
              filho
              retardatário

e me negam abrigo
e me negam afeto
e me negam o direito de ter ido

                        embora não tenha
                        feito sucesso
                        nem ficado
                        rico

retorno ao convívio
na hora aprazada
ao regresso

              não me neguem o tempo
                                       decorrido.

(Pedro Du Bois, inédito)


quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Modus vivendi

Alimentar, em:
http://amata.anaroque.com/arquivo/2020/09/alimentar

CERCAS




Fragilizo a cerca e com passos rápidos
encerro minha carreira: o esconderijo guarda
o medo ressentido no vento contra os vidros:
aguardo o tempo anunciado e do escuro
saio assustado buscando
 na distância a cerca
onde me instalo: o vento geme a minha dor
desacostumada: o ar gira o grito desumano
em que perco as lembranças: fortifico
a cerca com incertezas: escondo a lágrima
e com o rosto seco saio ao relento:
ouço a voz do irrealizável: abro
a cerca ao farpado arame
e deposito a carne: encerro a vista
em lamentos: a tormenta se afasta.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 7 de setembro de 2020

INERENTE













Ao braço longo da lei
                o rei
                insensato
                fala sobre casamentos
                em famílias descrentes
                do holocausto

           além da ideia
           a semente em terras
           inférteis incendeia
           o grão

o príncipe sente a tormenta
na proximidade da costa

            o galho perde a fruta
            e o verme se entranha
            em meandros oferecidos

a rainha em falsete
gera em pirueta sua ideia
infeliz: pão sobre a mesa.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 5 de setembro de 2020

INVENTÁRIO













Do que me é dado: do contrato a cláusula
do distrato a causa das razões a lei da dor
a sensação de fazer além do exigido do saber
reler as instruções do amor retornar no pranto
o lenço seco da paixão: do viver aqui estar

          enfrento o dia de amanhã e permaneço
          presente em minhas situações

                       rasgo a incerteza do passado
                       e me apresento na repulsa
                       com que os olhos enxergam
                       os poucos conhecidos.

Almoço na hora certa e na descoberta
me faço desconhecido: não acrescento
ao contato o sentido da pele ressecada

                        do nascimento a morte
                        do instante a distância
                        no outono a retirada

     Do que sou retirado sobra
     a marca tatuada da verdade.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 3 de setembro de 2020

LUZES














Sou o último
apago as luzes
fecho a porta
jogo fora a chave

não sou retorno
       nem entorno

em torno teço
estrelas unificadas
em destinos

deixo (nada autorizado)
escrito o último suspiro
e no cantar
o som se faz cíclica
                      resposta ao iluminar
                      o trajeto

(as luzes ainda acesas).

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 1 de setembro de 2020

ALIMENTAR














Ser a alimentação
na leveza da crueldade
implícita no gesto
de arrependimento

(a palavra evocada
 em agradecimento)

o corpo consumido
no anseio da inverdade

as verdades oferecidas
em objeção e reprimenda

o antepasto sucedido
pelos acontecimentos.

(Pedro Du Bois, inédito)