domingo, 31 de janeiro de 2010

SAGA

O vento sopra sobre as cabeças
os pés ao tempo em que distâncias encurtam
na vontade e na glória de alcançar o porto
de chegada e de partida para novas terras
onde vencidas tempestades revivem
diferentes estilos de reencontros

sobre a saudade nada falam
que o esquecimento é célere em silêncios
e fatos novos e novidades
trespassam tempos em sorrisos
de aproveitadas horas
de nunca mais
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. VI, fragmento)

quarta-feira, 27 de janeiro de 2010

BREVES GESTOS

Rejeitando os mitos perdemos as referências
das figuras que fizeram a alegria dos poetas.
Gregas, romanas, eslavas.

Os ícones são outros, concretos.
As dúvidas são outras, financeiras e editoriais.
A cultura pontual privilegia ascos
escritos em forma de auxílio intelectual.

Na ponta do lápis, na tela do computador,
a multiplicação infantil de duendes e gnomos
forjados em sessões de marqueting e publicidade.

Crianças perdidas em parafernálias eletrônicas;
jovens em caminhos tortuosos de pseudas ciências;
adultos sabedores do que estão vendendo;
velhos sabendo que não há salvação.

(Pedro Du Bois, BREVES GESTOS)

segunda-feira, 25 de janeiro de 2010

O LIXO REVOLVIDO

viajante de copo e cozinha
quarto de única aventura
o mundo pela janela

flutuantes sacadas
aconchegantes sofás

música de fundo

itinerantes ciganos caseiros
longas viagens até a lixeira
fuga e retorno do supermercado

estanques peças de madeira
reconhecimento e posse da cadeira
prisão entre pratos e copos

(Pedro Du Bois, O LIXO REVOLVIDO)

sábado, 23 de janeiro de 2010

RETORNO II

...
ir embora aos poucos
refazendo lembranças
e desfazendo o tempo
passado entre atos

desconsiderar possibilidades
sobre felicidades desencontradas:
registrar a cena
sobre o muro: a estrada
se sucede em esparramada
terra sobre os ossos do ofício
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. VIII, fragmento)

quinta-feira, 21 de janeiro de 2010

O COLETOR DE RUÍNAS

24

Ávido se aproxima
clama pela água.
O deserto responde
em miragens

- o delírio delimita
a paisagem em verdes
cânticos desproporcionais
ao ato: a sede
consome
o corpo

aproximações desencantam
as imagens: a sede prevalece
na razão
inequívoca
da morte
aproximada.

(Pedro Du Bois, O COLETOR DE RUÍNAS)

terça-feira, 19 de janeiro de 2010

TERRAS

Essa terra: longe alcanço
em vistas
é minha remessa:
desejo aventurado
ao transtorno.

Esta terra ao alcance
das mãos se desfaz
em gestos desmedidos: torpor
do corpo negado ao abraço.

A terra reside intransitável:

ódio
amor
indiferentes formas
de ser revisitada.

(Pedro Du Bois, DESNECESSIDADES REENTRÂNCIAS & ALGUNS REINGRESSOS)

domingo, 17 de janeiro de 2010

TRAJETO INVERSO

Hoje, casa fechada
irritação pelo momento
perdido

desconexo, o pensamento
não racionaliza
o feito, desfeita
a vida nada oferece

hoje, luzes apagadas
irritação e o tormento
encontrados

desconexo, carrega a roupa
sobre o braço, o paletó
do terno, terna
maneira de não amassar
o casaco

hoje, porta trancada.

(Pedro Du Bois, TRAJETO INVERSO)

sexta-feira, 15 de janeiro de 2010

HORA

Não escreva
quando a hora
for essa:

cachorros ganindo
pios de corujas
barulho de carros
passando ao longe

cessam as histórias
palavras são recolhidas
começam as orações: crentes
corações despedaçados

não aumente suas angústias
nem os gritos dos animais
em palavras que se bastam.

(Pedro Du Bois, OS CÃES QUE LATEM)

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

RECORDAÇÕES

...
revive o passado em sorrisos e risos
não o destrói nem o reconstrói na forma exata
como os dias menores de implicâncias
e sortilégios arremetidos sobre as árvores
contidas em doces frutos apetecidos

lições distribuídas entre as cadeiras
no sentido inato das organizações e métodos
do não seguimento de nenhuma carreira
que possa transmitir a sensação
do que volta aos bancos escolares
...

(Pedro Du Bois, POETA em OBRAS, Vol. VII, fragmento)

segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

O POETA E AS PALAVRAS

Ao poeta cabe o privilégio
da musa
ardendo
sobre o papel
na ânsia
com que o inverso
se apresenta

mero espetáculo
onde o poeta
guarda a sua graça

o poeta se guarda
ao átimo
do passar da musa
em caminhos diversos

mero instante
em que se inquieta
o poeta.

(Pedro Du Bois, O POETA E AS PALAVRAS)

sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

ADERALDOS

digo ver
aderaldo cego
como lembra
o que nunca viu
mas sabe das cores
nuances e detalhes
da visão perdida
aderaldo cego
no que digo ver
o pássaro sobre a árvore
enluvada mão sobre o ombro
o rosto da mulher contra o vidro
aderaldo cego
cantor da saudade e da terra
no que não viu nem lembra
e sabe o matiz e mete o nariz
cheiros da terra trazem a paisagem
fechada no escuro do que não vê
aderaldo cego
que me vê no que digo
e sabe da minha face.

(Pedro Du Bois, (A)MOSTRA)

quarta-feira, 6 de janeiro de 2010

EXÍLIO

Busca
na ânsia
do exílio
o desencontro
e o regaço feliz
de uma mulher

de palavras tristes e entonações baixas
com que os espíritos são trazidos de volta

a matéria cristalizada em pedra
renega a fluidez do início e o exílio
fechada porta do quarto de dormir.

(Pedro Du Bois, SEMPRE MULHER)