quinta-feira, 30 de julho de 2020

FORMULAÇÕES












Ignoro a fórmula.
Faço compras aleatórias
e as anoto em despesas
generalizadas: reformulo
                         desinformo
                         não informo
                         conformo

aos pósteros deixo dívidas
impagáveis. Aos próximos
prometo juros e multas.

Inúteis fórmulas
desacompanhadas.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 28 de julho de 2020

HABITAR














Apresentados os hábitos
habito a história: o cacoete
o fetiche o medo imorredouro
do adjetivo e as reticências
fazem água no descompasso
do latido. O eleitor de pijama
pensa o mau tempo ao levantar
se vestir e ir à urna eleitoral
depositar sua humilde
e despretensiosa vontade
de manter tudo como está.

Talvez o café com pão
amanteigado antes
que o médico proíba.

O arrazoado estéril das questões
incompletas e os substantivos
transformados em superlativos
adversários. Cingir a cintura
da dama e a levar nos passos
cadenciados da dança.

Dormir com a janela aberta
e ter o desconforto da chuva
molhando o tapete: atapetar
a casa no rápido passar
dos passos nas tábuas
silenciosas dos quartos.

(Pedro Du Bois, inédito)



domingo, 26 de julho de 2020

REVIVER












Avalio o sentido: se da morte
                           sou safado
                           em linhas
                           costuradas
                           ao corpo

          ressurjo vivo
          revivo o instante
          e o gesto não se repete

avalio as pessoas e digo
de travessias e do relógio
parado na penúltima hora.

(Pedro Du Bois, inédito)


sexta-feira, 24 de julho de 2020

RETENÇÃO












A retenção da hora no dia
acabado em capítulo de novela

- a irrealidade dos fatos
  consumida no abstrato
  espaço negado ao corpo -

a afobação na voz do eremita
diariamente em mesmas coisas

- sobre o dia de hoje: céus
  se sucedem em arcos
  e a íris dos olhos conflita.

(Pedro Du Bois, inédito)
 

quarta-feira, 22 de julho de 2020

AMBIENTE













Parado no ambiente
descanso a ruindade
do momento: na música
retenho o verso musicado
ao extremo gosto: dizia
de amores consumidos
em águas de passagem

afasto a corrente e me desfaço
em elos desencadeados: o ranger
da tela me arrasta em fantasmas

passado ao ambiente interno
arrisco o passo e me desfaço
em assuntos relembrados:

           traumas vitrificam
           manequins estáticos.

(Pedro Du Bois, inédito)


segunda-feira, 20 de julho de 2020

TANTOS












Em tantos estávamos
reunidos: uns aos outros
                vazios em ciúmes
                não reconhecidos

adultos significantes em sustos
inconcebíveis na idade percorrida
aguentávamos o vento e nas penas
dos pássaros flutuavam pesadelos

estávamos reunidos na imensidão
da casa: na peça principal diante
da mesa decomposta em pratos
e copos derramados. Reviramos
o lixo e não encontramos
a palmatória do mundo
nos gestos de frustrações
                             e raivas

em tantos estávamos na idade
passada em acovardadas idas
e retornos.

(Pedro Du Bois, inédito)


sábado, 18 de julho de 2020

AGORA













Agora cessado o espanto recolho
do ar a água no espanto da chuva
agora cessada a calma reparto
na mesa o pão na calma do pai
agora refeito em notas musicais
canto o chão pisado aos pés
agora certo da inteireza da tela
recomeço o tempo em iluminada
forma avivada: agora repetida
a vida em notas explicativas
repouso entre vírgulas: agora
na correção do gesto giro
o braço aos adeuses
inconstantes.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 16 de julho de 2020

ARREPENDIMENTO












Das tentações com que as serpentes
me encantam retiro a intriga
                                o inimigo
                                a morte do amigo

confesso a profissão de escrever
sobre o mundo: não ao mundo
apresentado aos meus olhos
mas ao mundo que me será
encarecido no regresso

professo o pecado enganoso
das palavras e o jogo revirado
em regras onde escondo a festa
                          revido a ofensa
                       e penso o pão
amassado em cada manhã

registro o espaço percorrido
pelas serpentes e em único
golpe as despedaço em vazios
significados que o pior pecado
                 é o arrependimento.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 14 de julho de 2020

SILÊNCIO












Cacofônico silêncio: meandros e curvas
labirínticas em que o lado se caracteriza
pela ausência: sinto a presença e nada
digo que possa assustar o vago sentimento.

No silêncio penso escutar lutas travadas
em aços de batalhas: deuses  abandonam
corpos dilacerados na linha imaginária
da memória. Ensurdecedoras vozes
teimam em prosseguir - perseguir -
o silêncio voltado ao óbolo.

Altares oferecidos em empréstimo
destacam o olvido de onde partimos
ao ocaso da inexistência.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 12 de julho de 2020

Modus vivendi

Corpo e Luz, em:
http://amata.anaroque.com/arquivo/2020/07/corpo_e_luz_1

FUTURO



Ausculto: o oráculo desdiz a previsão
de ontem: renova as esperanças
em cartas jogadas sobre o pano
(sujo pano de antevisões)

oculto o sentido e repito a pergunta
: o horóscopo traduzido em signos
  reafirma a cantilena antiga
  dos desprezos

(sujos desprezos escondem a sorte)
retruco: sendo meu futuro obscuro
espaço vago não lamento
a história antecipada.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 10 de julho de 2020

TriploV Info

Corpo e Luz, em:
https://mail.google.com/mail/u/0/#inbox/FMfcgxwJWjFBWSKqCxmQFthGFHsBhqjt

CORPO E LUZ












Onde na luz
escondo o corpo

ressurjo esbranquiçado
no lusco-fusco do domingo

- o domínio necessário
  ao retorno: o estorno
  do número apagado -

o leitoso corpo exacerbado
retira da passagem partes
não aproveitadas: a luz
estala a sequência
com que o ritmo
retoma o espaço

o corpo se mostra
em luzes descoloridas.

(Pedro Du Bois, inédito)


quarta-feira, 8 de julho de 2020

SER












Reescrito em risos
                suas lágrimas
                depositárias da esperança
                avaras de saudades
na busca incansável
do momento
raro de felicidade: encobre o sentido
das palavras em coisas adquiridas

                 perdida ao largo
                 em trabalhos utilitários

(produz o fel e o espalha
 em gerações sucessivas)

                  remete o passado
                  ao futuro e o faz novidade.

(Pedro Du Bois, inédito)
                         

TriploV Info

Aversões, em:
https://triplovinfo.wordpress.com/2020/07/08/poema-61/

segunda-feira, 6 de julho de 2020

TEMPO












Evoco a imagem materializada
em reconhecimento: recordo
os traços e sulcos
decalcam a face

outros tempos
violados ao tempo
ignorados ao tempo

(tempo: espaço entre o ranger
             de dentes e a saliva ácida
             do que foi consumido)

refaço os reflexos e no local
do encontro destruo a base

não há reencontro entre
fatos e o reconhecimento
cede espaço à indiferença.

(Pedro Du Bois, inédito)

Modus vivendi

Poema, em:
http://amata.anaroque.com/arquivo/2020/07/poema_18

sábado, 4 de julho de 2020

AVERSÕES













Avesso ao começo
desespero
e desperto
meu lado
triste: escuto no convite
          a verdade de não
          ser convidado

despisto minha tristeza
em leituras ordinárias

descubro os olhos
na tela diariamente
ligada

no alvoroço dos pássaros
reencontro o meu horário

visto a roupa fria
com que a noite
me recolhe.

(Pedro Du Bois, inédito)         

quinta-feira, 2 de julho de 2020

BARULHO












O barulho inutiliza
   o instante
   sonhado: incorpora
   ao nada a vida
   exibida em trabalhos

(a razão de estar aqui
 escrevendo palavras)

o barulho significa
a vida conhecida
na demonstração
dos atos praticados

(o silêncio é o retrucar
 do espírito desconsiderado).

(Pedro Du Bois, inédito)