sexta-feira, 29 de novembro de 2019

IMPORTÂNCIA

Penso na importância
dada aos fatos
(agora) irrelevantes

lembrados momentos
decisivos: risíveis
                   agora

- água turva da sujeira
  entornada ao poço -

restada importância
pela mediocridade
na vida diária
das miudezas
que dão sentido.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 27 de novembro de 2019

REIS

Aos reis os palácios
cabem como luvas
em dedos frágeis

loucos somos nós
que nos contraímos
pelas esquinas
como reféns
dos carros
que passam

dentro dos carros
os reis e as luvas
- seus palácios

o sinal em vermelho
faz parar os carros
e os reis escondem
seus rostos

o refém deixa a esquina
                    e atravessa.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 25 de novembro de 2019

REAPRESENTAÇÕES

Tudo o mais
transformado
em (in)verdades

poucos recursos cênicos
parcas mágicas
indigentes palavras

a mentira representa
a (sua) verdade
       a que estamos
         acostumados.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 23 de novembro de 2019

FUNERAL

Esses olhos
           viram a continuidade
           em avessa
           dança estática
           na imobilidade aérea

esses olhos
          veem o começo
          no que lembram
          do espaço imenso
          fechado em ares

                  esses olhos
          nada mais verão
       na reversa história
recontada em pedaços.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 21 de novembro de 2019

DIÁRIO


De todos os espíritos a luz concedida aos poucos
anima as sombras entre árvores Parreira frutificada
Novos líquidos Sensações indizíveis Saudações
Por tudo que for tomado o território será o trunfo
maior por sua inteireza pela cobiça dos vizinhos
pelas mulheres dos homens que foram embora
para as guerras Líquido encorpado no que ocupa
a cama Espírito redivivo das conquistas Honras
Ao guerreiro a vitória interessa Prêmio Castigo
Castigada mente em questões menores O espírito
ilumina o corpo presente na reprodução A bebida 
transborda o cálice Corpos embriagados de maridos 
traídos Foram para a guerra defender suas pátrias
A ressaca adoece os olhos Morte Suas mulheres
nas batalhas diárias Filhos secos Parreiras.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 19 de novembro de 2019

NOVO

Traz o novo na fragmentação
                                 do velho
                   na demonstração
                              do pecado
                   na transfiguração
                             do repetido
                   no deslocamento
                                  do justo
                        na delicadeza
                             do detalhe
                              na junção
                          dos opostos
               no criminoso choro
      com os olhos de sempre

           não é novo quem traz
              o velho desfigurado.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 17 de novembro de 2019

SOBRA

Não está aqui
local vazio de sombras
representantes do atraso

a pira arde o óleo
e o pano bandeira
de novos tempos

(sombras por onde andam?)

não estão aqui
sombras sem locais
câmaras frias de flores congeladas

amores a serem encontrados
consomem o óleo e o pano
tornam rotas as bandeiras
no esconder a sombra
no que sobra: amizade.

(Pedro Du Bois, inédito)

               

sexta-feira, 15 de novembro de 2019

UTILITARISMO

Caminho percorrido

mentalmente reabro
a caixa de brinquedos

longínqua infância
revivida

embrulhado em papel de seda
escondido em papel jornal
no que sobrou do saco de pipocas

o novo

esquecido desde o começo.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 13 de novembro de 2019

CRIME

Com o pedaço de papel
limpa cuidadosamente
o sangue no assento

acende o fósforo
queima o papel
ensanguentado

junta as cinzas
sobre outra folha
imaculada de papel

mistura as cinzas ao leite
- mistura bem as cinzas ao leite

bebe devagar o conteúdo
do copo - sem pressa -
na última refeição do dia

a primeira da nova vida
na culpa que acompanhará
seu corpo e mente.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 11 de novembro de 2019

ULTRAPASSAGEM



Sou quem me ultrapasso
tinha você pelo braço
no perdido corpo
de outros abraços
ultrapassados

ciente do destino no sinal fugidio
avanço e retorno e falo ao guarda:

   não há outro caminho 
   na espera da atropelada hora 

sou quem me ultrapasso
e exausto repouso o corpo
na soleira que acolhe e esconde
o cansaço em que me encontro

silenciosamente escorrego os pés e o barro
marca a passagem ultrapassada no medo
trazido de casa: hoje é meu dia de passar.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 9 de novembro de 2019

BEIJO



O beijo na falsa imagem
dos sonhos sobre a mesa
em negociação barata

pedras e pedras jogadas 
no rio impedem a passagem

a barragem o barco e as pedras
trancam a vida em paisagens
aquáticas de espíritos afogados

eternizados deuses desesperados
buscam suas redentoras mortes
de poucos anos e promessas

forçam pedras em avalanches
capazes de ruírem muros
e reintegrarem águas à paisagem

no beijo da amada: molhados lábios
em sua boca na sensação das águas
em que a vida segue o espaço.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 7 de novembro de 2019

Navegar é Preciso - Tânia Du Bois


Du Bois sobre Leminski, em:
https://books.google.com.br/books?id=dFsrAwAAQBAJ&pg=PA59&lpg=PA59&dq=%22Pedro+Du+Bois%22&source=bl&ots=siQD4vzFqP&sig=ACfU3U2b_V9_WUXIQ8zumhUacT9HNATVYg&hl=pt-BR&sa=X&ved=2ahUKEwiOgonUx9nlAhXfGLkGHcQrBqM4PBDoATABegQICRAB#v=onepage&q=%22Pedro%20Du%20Bois%22&f=false

TERRAS


até aqui o país geográfico
em terras de donos infindáveis
no nada arado e o gado ausente
das decisões em cartórios

depois outro país geográfico
de linguajar diferente
e costumes acostumados
em terras que não pertencem
deixadas para os parentes

além da geografia a terra
que tem outros donos
proprietários multiplicados
de fronteiras em que soldados
perseguem prendem e matam

além de tudo não há nada
que possa ser desocupado.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 5 de novembro de 2019

PASSEIOS


dias passeiam entre músicas
cantores embalam insetos
em esvoaçantes ventiladores

o coro repete o refrão
a piedade refaz a oração
em solteiras intenções

tardes recolhidas no desfazer
a comida e lavar a louça
descansado das loucas noites
anunciadas em gritos

o copo vazio de ontem
iguala as apresentações
bisonhas de arcos e flechas
que ferem secos amuletos

dias pensados em músicas
na tarde em atrasos.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 3 de novembro de 2019

NOITE



Na noite repleta de escuros cantos
a luz espanta os corpos que se encontram
em conversas antigas de muitos anos

lances sorrateiros e o apito do guarda
que o medo retira a vontade
de serem encontrados
no irrealizado verão
de luzes e noites quentes

fossem escuros cantos
onde continuassem anônimos
e o vento levasse os papéis

não seria a noite o receptáculo
de legumes e verduras chegados
à mesa de quem dorme

não se fazem negócios enquanto a noite
esconde os clarões humanos: agenciada
em vidas e mortes descoloridas.

(Pedro Du Bois, inédito)