sábado, 24 de outubro de 2009

ARMAZÉM DAS PALAVRAS

A renovação da vida escuta o discurso
sobre remunerações prêmios e brindes

a vida da pessoa pobre e triste transformada
por obra e graça em feliz a rica

a mão dos deuses sobre a cabeça
na glória indivisível do dinheiro recebido

a riqueza em corpo e roupas no preço
recebido pela ignorância

o não mistério poeira e pó enriquecidos
em radiativo minério e mentiras esparsas

a graça do encontro entre os corpos
na negação da hora aurora anunciada
em discursos negados ao pleito o preito
agradecido na minúcia em que a miséria
se hospeda: casa recebida em herança
de palavras anunciadoras das catástrofes

no meio do caminho a nova raça interrompe
a marcha fúnebre e a cabeça retirada
ao corpo em outras roupas.

(Pedro Du Bois, ARMAZÉM DAS PALAVRAS)

quinta-feira, 22 de outubro de 2009

(DES)TEMPO

Retorno ao tempo, horas refeitas
em brumas, escuras escoras estampadas
em selos descolados, envelopes repousam
sobre mesas, presos, sentimentos
aprisionados, pesos sobre palavras
não enviadas, arremetidas e desoladas
mãos nervosas, o tema sobrepuja
a vontade, materializada dor,
rememoro o trigal e o quintal,
pássaros, raivas e lamentos, o riso
raro emerge memórias, profundas
camadas em pedras não preciosas,
cálculos matemáticos e horror ao vento,
invento o tempo passado: lembranças
impostas ao nada trazido na dualidade
dos seres emprestados aos tantos
fantamas corporificados
em músicas ligeiras.

(Pedro Du Bois, (DES)TEMPO)

quarta-feira, 14 de outubro de 2009

A NECESSÁRIA PARTIDA

Aceno no reconhecimento ao adeus
do pranto: ir embora no rompimento
amigável e hostil do ato de partida

aceno e evito olhar o passado

esqueço o travo e desconsidero a hora:
partir é mergulhar o horizonte ao fosco
cansaço do corpo presente

refaço trajetos em acenos
e revolto o corpo

(sonhos permanecem em paredes
onde insone passeio minha vontade)

não aguardo: ofereço a entrada
e desapareço na estrada. Pago a passagem
com o suor da espera e me reconforto ao trajeto

(lembro a imagem errante do espelho
e me pergunto se haverá outro reflexo)

ir embora na culpa por não ter ficado:
reflexiono sentimentos e me faço inteiro
na oportunidade do aspecto e no despropósito:
entrevejo a bruma e no escuro tempo
sou louco cego surdo mudo desalento

(trancado em anos esgano a vontade
e faço do pássaro o espaço vago
na utilização do corpo)

volto ao tempestuoso dos que ficam:
do andarilho o trajeto na cristalização da terra

os pés na escalada: cair e levantar
na necessidade alterada das dificuldades

(deixo as folhas ao veredicto: palavras
não suprem a necessidade de ver o mundo
com os meus olhos)

ergo o punho em vingança: sair
avantaja o ser aos que ficam.

(Pedro Du Bois, A NECESSÁRIA PARTIDA, Volume I, inédito)

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

MÚSICA

A oportunidade revela o gesto
da água ao escorrer o corpo: música.

Estar no lugar
da incerteza
e (se) perguntar
sobre a vida trespassada
em palavras.

Oportuno desencontro no espaço
temporizado: música.

Opor ao objeto a sua sombra
e retirar o esboço do contorno.

(Pedro Du Bois, DESNECESSIDADES, REENTRÂNCIAS & ALGUNS REINGRESSOS, inédito)

domingo, 11 de outubro de 2009

A CONCRETUDE DA CASA

2
A casa abre espaço ao corpo:
o portão rememora a chegada;
não prende, liberta na imensidão
das peças: reconhece cada canto
de encerrados encantos; espaço
delimitado ao corpo: cama, roupeiro,
cadeira, escrivaninha; a casa
demarca seu território: espaço
comum na divisão da história.

(Pedro Du Bois, A CONCRETUDE DA CASA, inédito)

quinta-feira, 8 de outubro de 2009

VIA RÁPIDA

28
Rememoração: certa vez encontrou
o futuro irreconhecível em escândalos
de dias aclarados aos fatos subsequentes

correu para casa ao relento.

O rebento nasceu naquele dia:
pela noite.

(Pedro Du Bois, Via Rápida, inédito)

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

O PRIMEIRO EXERCÍCIO

III
A noite expande
a incompreensão do siso

prejuízo decomposto
em raivas
e medos

(os olhos fechados visualizam
barulhos de acesso)

dorme o sonho inconstante
e ininterrupto: a dor
se apresenta
em cada gesto.

(Pedro Du Bois, O PRIMEIRO EXERCÍCIO, inédito)

terça-feira, 6 de outubro de 2009

RUDIMENTOS

4
À imagem
espelhada
espalha os dentes
em riste: medo de ser objeto
da carniça

o riso é a última
etapa do esgar
primeiro: começo.

(Pedro Du Bois, RUDIMENTOS, inédito)

domingo, 4 de outubro de 2009

O DESCRÉDITO E O VAZIO

1
Rouba a cena. Introduz
no esquema a arma
descarregada sobre o pobre
corpo. Rico
ambiente
hostilizado.

Assaca salvaguardas
e se prende
em casa. O elevador
desorientado perambula
em vazias escadarias.

(Pedro Du Bois, O DESCRÉDITO E O VAZIO, inédito)