segunda-feira, 2 de janeiro de 2012

REMANESCER

Na condição exemplar de quem luta

pela liberdade pátria e ensanguenta

a roupa rasgada na fuga pela mata

concretada das emboscadas

ao longo das cidades


rebelde cantador de músicas ligeiras

altera o ânimo dos descrentes

e ouve a palavra de ordem


jovem envelhecido no combate

das pedras e das perdas

acumuladas na sorte

grande de loterias espúrias


quem avança pelo flanco

e de ambos os lados

recebe os tiros

desferidos em defesa

do que chamam de honra

de família e de liberdade


sobre a vida interrompida

na manhã não esclarecida

de armas sobre as mãos

e de mãos para cima


na desonra de ficar em casa

e fazer da trincheira

mero apetrecho de inverdades


luta pelo dinheiro adquirido

na transação das espertezas

e se diz presente

em cada dia de trabalho


no direito inalienável de ser traído

atraído pelo lusco-fusco das histórias

mal contadas em mesas e escrivaninhas

de poderes desacompanhados de copos

vazios do líquido sôfrego em gargantas

secas de acompanhamentos


avança em vida e se diz rendido

aos prazeres da mecânica

monetarista em discursos ocos

de semânticas arremessadas

ao corpo jovem que se distrai


ao alcance da mão tem a verdade

e a joga fora na saciedade infinda

dos contratos firmados em letras

garrafais de onde ressurgem dias

anteriores de graça e beleza

e os estertores dos canhões

não mais direcionados


sobe ao limbo e retira a folha

impressa colada ao poste

na desfeita imagem

esterilizada do cometa

decadente da vitória


é sobrevivente

e recebe a desgraça

da vida alcançada

nas palavra tosca das sirenes

disparadas em alarmes

de quem luta

em vão e perde a batalha


acende a luz e se revê no espelho

como visto através do vidro

que separa sua vida

do mistério inexistente

em olhos silentes

dos perigos e das maravilhas

das horas travadas


tenta dormir em cada noite

e no escuro do quarto escuta

vozes desconhecidas

em batidas laterais

no corpo que se debate

enquanto dependurado


(ofuscado domínio perde

conjecturas e se espalha

sobre o nada restante

das evidências)


altera palavras em interrogatórios

e desdiz o dito em que acrescenta fatos

fortuitos e da desdita sabe a ocorrência


porque alguns se intrometem

e recebem elogios indevidos

percebe a tática usual

das carabinas em avanço célere

sobre corpos desacompanhados

na escuridão do tempo

onde enterrados os mitos


não é você quem se arvora

em companheiro e desarruma a cama

desfeita em abraços fosse o lado

avesso das conquistas

e pernoitasse

em derrotas sucessivas


aumenta a dor e nada conta

aos ouvintes desatentos

das conversas bêbadas

nos bares da vida


escritórios reluzentes conduzem

pessoas avizinhadas ao sucesso

inconsumido por onde transitam

e espreitam novos senhores

despercebidos nas batalhas


outros tempos de encobertas

verdades assoberbadas de tarefas

burocráticas fazem da história

mera cortina entrecerrada

em pontos finais


remanescente dos tempos

não lembrados tem a memória

e a dor de a ter conduzido

em cada passo marcado

em ferros atravessados

sobre as mãos


do lado de fora não se volta

ao sucesso: lembranças

da companhia incruenta e cruel

nas desavenças não permitidas

em tempos presentes.

(Pedro Du Bois, inédito)

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