segunda-feira, 30 de julho de 2012

DEFINIR

Da palavra não escrevo o nome
encontrado no dicionário

          (desgastado nome
           por todos conhecido)

escrevo o nome sob outro nome
encontrado em dicionários

           (desgastado na formulação
             original)

junto os nomes: original
                          emprestado
            em novo significado

            (agastado ao dicionário
             em significação)

os nomes são renovados
até que tenham o conteúdo
em único nome

            (na simplificação
             do dicionário).

(Pedro Du Bois, inédito)
      

sábado, 28 de julho de 2012

VIDAS

Devasso homem
de cabelos brancos
estaciona o carro
no lugar escuro
              confessa ao dia
em nascimento
o tormento de haver
passado a noite
entre ruas vazias
de sentimentos

olha o dia amanhecido
e o choro o deforma
em criança.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 26 de julho de 2012

TRAJETOS

Rápido
o foguete
some da minha vista

avisto o espaço
branco da passagem

pelo rádio o astronauta
              transmite dados
sobre o vazio da viagem

busco as razões
da jornada

fecho a janela
cerro a cortina
desconecto os cabos

no escuro do quarto
sei da trajetória.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 24 de julho de 2012

FERA

Pelas razões de estar sentado
escrevendo fatos não acontecidos:

     na mão a serpente envenena
     o hábito em que me escondo

dos encontros
nos caminhos percorridos
em estradas entreabertas
ao castigo: a fera domesticada
em anos de entregas
retorna na irracionalidade
do corpo desperdiçado
no bote da serpente: nas razões
das palavras escritas na hora
                   da despedida sinto
o cansaço da fera e sua revolta
em grades: feras nos elementos
                  insanos do presente.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 22 de julho de 2012

ÁGUAS

O barulho da água
na limpeza do rosto
       ecoa pelo ralo
       desce pelo cano
       armazena em tanques

nossa sujeira
nosso cheiro
nosso perfume
nossa parte lavada do rosto

a água apodrece na referência
do que somos por instantes.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 20 de julho de 2012

TEMPOS

Observa o tempo
marca o personagem
guarda o tempo
planta e colhe

frio
e calor

noite
e dia

esquece os deuses anteriores
e se distrai entre calendários

onde o gado nasce
onde a hora passa
onde a criança cresce
e o velho morre

reserva a data em que rememora
o tempo livre da caminhada.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 18 de julho de 2012

APOSTAS

Aposta sua sorte
no azar da resposta
dada ao destino

dados rolados sobre o verde
avançam sua vida destituída

a utopia expõe o precioso
metal desvalorizado

sua sorte fortuita em gestos
desmesurados: hoje
                    ontem
                    o amanhã
                       entrevisto

o prêmio azara os fatos
e os desmonta em novas
                             apostas.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 16 de julho de 2012

ESTILO

Preso ao estilo
    flutuo palavras
 afogo lágrimas
        inundo campos
destruo paisagens

retorno ao leito
onde meu corpo exausto
coberto em extremos
sucumbe ao som
submerso de estilos
e vontades: livre do estilo
                   me conforto.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 14 de julho de 2012

RITOS

Atravesso a ponte
na água solto as amarras
desço o rio
          amarrado ao bote
          que destroça

sob a ponte
ultrapassada

retornam pedaços flutuantes
e bóia o corpo encharcado
enquanto a ponte permanece
                             intacta.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 12 de julho de 2012

TERRAS

O mar atravessado
circula a terra conhecida

portos encontrados
acolhem corpos fixados

ao futuro dedica o brinde
da chegada: presente
no instante  aterrado

o mar repele o corpo
do afogado: cabe providenciar
pássaros que o bicam
em ossos estalados

ao futuro cabe o agradecimento
representado na terra continuada.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 10 de julho de 2012

PRISÕES

Após o primeiro cárcere
diminuto em metragem
vislumbro o próximo
ampliado em significados

o infindo horizonte
desenha a cela
onde trancafiado

o telescópio demonstra
em imagens a certeza
de ser prisioneiro

acelero minha velocidade
de deslocamento: entre celas
                             faço de conta
                             estar livre.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 8 de julho de 2012

ODISSEIA

O trabalho enfeita
o espaço: a nave
                circunda o mundo
                               conhecido

o astronauta sabe do retorno

                  suas pernas
                  doem na liberdade
                                corpórea

o tempo
cessa a passagem

                    o astronauta
                    - ínfimo personagem -
                    desliga o texto
                                 o ar
                                  a luz
                                   o contato

sobre o trabalho feito
repousa o personagem.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 6 de julho de 2012

PASSAGEM

No vigor dos anos passados
em branco
      esquece o corpo
      aos cuidados amorosos
                     das manhãs

ao homem envelhecido
de saudades sobram imagens
opacas de mulheres

o branco dos cabelos
sentencia o olhar
esbranquiçado
das amantes
      (desconsideradas)

o homem idoso
desconsola o corpo
em memórias.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 4 de julho de 2012

SONHOS

A lembrança
encanta: decantado mundo
inexistente do passado

(a fulguração da cena
desconcerta: música
paralisada ao ouvido)

diante do quadro estático
se destaca

se adianta ao tempo
e perpassa

(a desfiguração do corpo
contra a luz)

restitui a lembrança do esquecido
gesto não realizado: nos sonhos
a incompreensão dos fatos.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 2 de julho de 2012

SIMPLES

Simples questões não respondidas: de quantos
Passo Fundo fomos feitos nessa geração
efêmera. Os que foram embora,
os que ficaram, os que retornaram.
Aqueles que se recusaram.
Os que morreram.

Passo Fundo nos reconhece e atrai. Impõe
e dispõe no espaço ampliado dos caminhos:
o boqueirão aberto ao passo, o cemitério
ultrapassado, o sexo reavido ao acaso.
Antigas estradas e territórios cedidos
em concordata. No desmembrar
permanece como história
e mentiras amenizam
os fatos encobertos.

Simples quesitos impostos a cada um de nós,
do Passo Fundo remexido em praças
transplantadas, prédios demolidos,
passados desfeitos, antigos feitos
desconsiderados.

No Fundo, o Passo alivia a fuga
e o corpo se volta no passar do ônibus,
curva-se ao avião que sobe, recusa-se
ao trem inexistente.

Questionário incompleto, repleto.
Reflexo da imagem nas águas
impuras da praça.

(Pedro Du Bois, inédito)