segunda-feira, 30 de abril de 2012

COBRANÇAS

Não me cobrem a medalha
a honra
o mérito
a encoberta história
mal contada

cobrem o enredo da teia e da rede
de pesca o peixe semi-morto

cobrem o óbolo roubado ao cego
e ao cão cegado na escuridão
do inferno em outros nomes

cobrem o óleo espargido ao acaso
e o fogo consumido aos poucos

não me cobrem a medalha
exposta em glória: na especificidade
o orgulho se desnuda
e aos lados afloram
anos continuados

cobrem o álcool derramado
na contagem final da cena.

(Pedro Du Bois, inédito)

sábado, 28 de abril de 2012

SENHOR

Senhor das batalhas, cede ao encanto
da terra molhada: para o corpo
e recupera da relva a calma
em que foi criado; batalhas
inibem sonhos inventados em anos
verdes de conquistas: anos de descobertas
anímicas e de cansaço físico de prazeres

tanto a batalha vencida
no grito e no tinir da espada
ao tiro longínquo do canhão
da esquadra, ao quanto
envelhecido nas jornadas,
ao inverno ressecado na terra
abandonada, quanto aos túmulos
indesejados dos amigos, ao céu
descolorido no fim da jornada

cede ao encontro da terra jogada
sobre o corpo.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 25 de abril de 2012

CHUVA

Sobre a chuva
na sensação da vida
conduzida ao indelével
estado de nobreza: não
nobiliárquica no pressuposto
do poder e do medo atávico
soubesse a origem da nobreza
estéril nos entreatos onde
o nada produz o gesto vazio
da espera. A chuva é a espera.

Pedro Du Bois, inédito

segunda-feira, 23 de abril de 2012

LEMBRAR

Mnemônico
guardo o restante:

          alimentações se repetem
          em necessidades.

 (Pedro Du Bois, inédito)

Brevidades, o livro

Meu novo livro de poemas, Brevidades, editado através do Projeto Passo Fundo, mantido por Ernesto Zanette, foi lançado em Passo Fundo (RS)na tarde/noite de 19.04. Na dedicatória - para Tânia - escrevo que: Por instantes o encontro se consuma: sou eu que descrevo e escrevo sobre a efemeridade em que me (re)conheço. Seria assim, não fosse apenas um poema a dizer da brevidade do pensamento e dos atos cotidianamente abstraídos em minha vida. As afirmações soam perigosas, mas não posso fugir aos itens elencados. Por isso a procura dos pontos que me sustentam, mesmo que – como sempre – transitórios em sua literalidade.

sábado, 14 de abril de 2012

OUVE

Ouve, sou o som anterior,
o refrigerador arrefecido
na temperatura ambiente,
o fogão cozido no estrago.

No estrado o pé faz
o passo no voo do pássaro.

Ouve em mim o antiverso
das palavras: a sagração da hora
na repetição do grito das crianças
no linguajar dos entendimentos.

O rádio ligado na canção rouquenha.

Ouve em mim o estalar dos ossos.

Maneira de me fazer átono,
de me dizer átimo, de me ouvir
em último recado.

(Pedro Du Bois, inédito)

quinta-feira, 12 de abril de 2012

AMAR

Se a hora é cedo
                   cede ao contato:
                   corpos se aquecem
                   e o tempo arde

na tarde dos arrependimentos
sabe, sobre o que foi dito acha,
do encontro lembrado pensa
em se desvencilhar do fardo

               sendo cedo: concede
               ao tempo o encontro
               satisfeito dos amantes.

(Pedro Du Bois, inédito)

terça-feira, 10 de abril de 2012

ABSORTO

Passa absorto. Absorve a lama
endurecida dos recados. O recato
                   na mulher despossuída
                   em corpo ainda jovem

                   epopeia não ouvida
                   no relato. O realejo

toca miscelâneas de proveitos
e peixes absortos repousam
                            no aquário.

(Pedro Du Bois, inédito)

domingo, 8 de abril de 2012

CORPO

Acorda sua vida
uma vez mais

única razão
para ser presente

na ausência futura
deixa dormir
o corpo
sobre o leito

o defeito o transforma em mera referência
de tempos idos: fantasma esmaecido
em bruma de desconhecimento. Corpo
sobre corpo abre os olhos e diz
do sofrimento em não ser lembrança

único corpo sobre a cama
e esse corpo dorme.

(Pedro Du Bois, inédito)

sexta-feira, 6 de abril de 2012

NASCIDO

Nasço desterrado.
Nenhuma janela
se abre ao interior
              do quarto.

Sou do ventre o livre despertar
do corpo: a água quente
me lava em espinhos.

Sou ilha isolada no mundo
dos subterfúgios. No olho
do pai o brilho avermelhado
do outro mundo. Em minha
mãe antevejo a razão do medo.

A guerra terminada me impele
ao continente. Nu o corpo apreende
o raiar do dia.           A pedra sorve
    a quentura escondida em roupas.

(Pedro Du Bois, inédito)

quarta-feira, 4 de abril de 2012

SONS E SILÊNCIO

Nenhum silêncio
profetiza o tempo: grito
saliente da vida inconsumida
no renascimento

aqui na crença e na confiança
afeita no milagre
da multiplicação do som

nenhum som prediz o tempo
do silêncio reposto
sobre o tampo.

(Pedro Du Bois, inédito)

segunda-feira, 2 de abril de 2012

TARDE

Nada espero da tarde
         o anoitecer (manto)
         mente sofrimentos
         nos encantos (tantos)
perdidos após a hora:

              manhãs iniciadas
         frias em após auroras
         desconhecem as luzes
         do impedimento: crescer
e se fazer tarde (passagem)
                em lamentos.

(Pedro Du Bois, inédito)